sábado, 16 de março de 2013

" AMOR "



Fui ver um filme laureado com a Palma de Ouro 2012 no Festival de Cannes, e vencedor dos Prémios do Cinema Europeu.
Realizado pelo austríaco Michael Haneke , tem como actor principal, um intéprete que me transportou aos meus desassete, dezoito anos - Jean-Louis Trintignant, protagonista do velhinho "Un homme et une femme" dos anos 60, que foi uma referência na minha vida.
Sabem aqueles filmes românticos, que vemos de mãos dadas, quando se "curte" uma paixão, e portanto, o mesmo lhe fica associado ?
Pois é ... Então,  eu encontrava-me nesse estado !... (rsrsrs)

Não lembro rigorosamente nada, do enredo do bendito "Un homme et una femme".
Lembro o par romântico que lhe deu vida, como disse, Jean-Louis Trintignant e Anouk Aimée, e lembro a banda sonora da película, que dancei na altura, em uma ou duas matinés, ditas de "garagem", das poucas vezes em que consegui permissão da minha mãe, para um programa.  E vejam bem ... Que programa !!!...

Pois agora fui encontrar um Trintignant velho, obviamente, o que me fez percebê-lo também um comum mortal, mas com uma interpretação igualmente ao seu nível ... magistral, simplesmente !

O filme "AMOR", aborda comoventemente, com uma naturalidade, uma objectividade e um realismo espantosos, exactamente esse sentimento entre um casal de idosos, Georges e Anne.
Professores de música,  e com uma vida normal,  Anne é repentinamente surpreendida por um grave problema de saúde, um Acidente Vascular Cerebral que a incapacita, não só da sua profissão que ainda desempenhava gostosamente, como da sua vida diária.
Desde a rotina comum do dia a dia, alastrando progressivamente a tudo, a incapacidade e a dependência, acabam confinando-a a uma cama, onde mais vegeta que vive.

E somos portanto confrontados com uma situação tão espantosamente óbvia, da qual conhecemos  "n" casos - do vizinho, do amigo, do conhecido - e que normalmente não consciencializamos, que efectivamente um dia, pode ser nossa também.

Todo o filme se desenrola, pondo o espectador perante as dificuldades ( todas ... as pequenas e grandes dificuldades ), da realidade diária daquele casal, que tinha consigo, contudo, uma arma poderosa e indestrutível ... o amor partilhado, dividido, cumpliciado, dado naturalmente e sem limites, sempre ...
Um  amor-abnegação,  um  amor-rochedo,  um  amor-muralha ...

Sendo a mulher, a paciente nesta vissicitude, e tratando-se de pessoas da faixa etária que referi, inseridas numa sociedade, em que pelas suas idades,  terá sido seguramente conservadora, mais enternece ainda, que aquele homem leve até ao fim, com um amor, uma coragem e uma determinação, todas as tarefas, todas mesmo, visando a manutenção da sua mulher, no seu espaço de vida  e de conforto, por forma a minorar-lhe o sofrimento.

Transformando-se praticamente num vegetal, sem fim à vista, fácil seria para Georges, interná-la numa clínica, num hospital, num lar ...
Apenas, não é isto que acontece.
Desde cuidá-la nas necessidades básicas, a ler para ela, a passar-lhe música, a falar-lhe docemente a "contar-lhe" Vida, tentando dessa forma "puxá-la" ou  mantê-la ligada a ela ... tudo isso preenche os seus dias, enquanto se vai assistindo na tela, à degradação progressiva de Anne, e à devastação provocada pela doença, na vida daquele casal.

O filme termina, com o mais supremo e sublime acto de amor, de que um ser humano seria capaz.
De uma forma calma, serena, interiorizada e assumida, não querendo que alguém que ele amou acima de tudo, companheira de uma vida e já um farrapo da mesma, pateticamente continue num sofrimento sem retorno, Georges decide pelo fim daquele "inferno" para Anne, e posteriormente para si, porque a sua razão para viver se  esvaziou,  e  se  tornou  insuportável  prosseguir  o  caminho  sozinho ...

O filme é basicamente isto que narrei.
Não dispensará no entanto, que o vejam.
Aliás, o drama vivido por Anne e Georges, só consegue ser claramente percebido, sentido, valorizado, penetrando-se na permanente semi-obscuridade ( intencionalmente marcada ), daquela casa, entrando-se naquele quarto, olhando-se aqueles rostos angustiados, mergulhando-se no desnorte do olhar vazio e distante, de Anne,  na recta final ... assistindo-se à decisão doída e desesperada de Georges, como epílogo de tanta provação.

Emocionei-me, sem dúvida ... Como não ???

Quantos serão os mortais, que terão a felicidade de no fim das suas estradas, realmente, para o bem e para o mal, terem às suas cabeceiras um Georges ??
Quantas serão as Anne, assim tão privilegiadas e abençoadas ??

Creio que cada vez menos, muito menos ...
Terminaremos sozinhos.
A maior parte de  nós,  terminará  efectivamente sozinha ...
Essa, a triste realidade das vidas, talvez a sua maior certeza !!!...

Anamar

2 comentários:

F Nando disse...

Se a vida fosse um guião de cinema seria uma grande chatice. Já estaria tudo escrito e aqueles imprevistos que são o sal da vida seria um deja vous.
Disfrutando da vida e todas as surpresas que ela nos reserva...
Beijinho

anamar disse...

Às vezes bons ... às vezes não ... Quase sempre, mais vezes não do que sim.

"Guião", eu não queria, mas também prescindo da sua "veia" madrasta !

Um beijinho

Anamar