sexta-feira, 12 de setembro de 2008

"A LONG, LONG ROAD..."



O ano escolar está à porta.

A lembrar-mo, está uma "bendita" reunião geral de professores, amanhã pelas nove da matina...

Ano que se inicia, trouxe-me inerentemente à ideia, um tema que, penso, tem hoje e terá sempre, toda a acuidade e toda a oportunidade para ser abordado e reflectido: a educação das crianças, jovens e adolescentes, pertinente e desejavelmente a começar em casa, onde os pais deverão ter um insubstituível papel a desempenhar.
Esse papel é seu e só seu. Ninguém nunca os poderá ou deverá representar.
Para lá do amor e dos cuidados primários que um progenitor tem que assumir para com o seu filho, a educação que lhe ministra, será paralelamente um bem inalienável, herança que o acompanhará pela vida fora, mais-valias, como peças de uma sociedade onde deve saber "mexer-se" e posicionar-se, como "gente de bem"...

Formalmente, a educação e os moldes em que hoje se processa e veicula, pouco terão a ver com padrões institucionalizados lá para trás;
contudo, o "direito a ela", nunca foi tão reivindicado, dissecado, analisado, por mil razões que todos conhecemos e que não pretendo abordar neste post, sob pena de me alongar exageradamente.

Vou portanto tecer algumas simples considerações a propósito, mãe e filha que sou...


A minha mãe caminha para a invejável idade de oitenta e oito anos.

Invejável é um lugar-comum aplicável na circunstância; isto, porque eu talvez inveje à distância, poder lá chegar...(até lá não vos garanto que não mude de ideias...) e não porque eu ache uma maravilha ter essa idade.
Aliás, eu "bulho" com a minha, como poderia achar "supimpa" apagar essas velinhas??!!

Bom, mas o importante da questão é que ela está viva, cheia de energia, com uma cabeça, essa sim invejável atendendo ao "desgaste do material" e muita muita vontade de viver. Por ela, estou certa, apagaria por cá as 176 velas, ainda...

A minha mãe é, como vêem, duma geração muito, muito lá para trás, com vida, valores, educação, sonhos que nada têm a ver com os actuais.

Fui educada por ela, como filha única que sou, dentro desse figurino. E digo "educada por ela", porque o foi na verdadeira acepção da palavra, dada a precária presença física do meu pai.
Como tal, sempre se assumiu como timoneira da "minha embarcação", numa exagerada centralização de responsabilidade absolutamente desproporcionada.

É verdade que era um tempo em que o acto de educar talvez estivesse mais facilitado que hoje.

"Educar"não é provavelmente o termo correcto...Na verdade "guiavam-se" ou "conduziam-se" pessoas; de alguma forma, fabricavam-se ou induziam-se pequenos "robôts", que salvo honrosas excepções, não reivindicavam, não questionavam, pouco perguntavam, aceitavam com submissão (quase sempre quase tudo), não recalcitravam, raramente chantageavam e quase nunca se impunham.

Hoje, de acordo com os métodos e princípios pedagógico-didácticos com que se educam os filhos, isto não parece fazer qualquer sentido, mas quem for da minha geração, sabe bem do que falo.
Era a época em que os pais diziam: "É assim, porque é!...", "Não fazes, porque eu não quero!..."

Sofri na pele estas "regras de formação"; imprimi estes "preceitos" de conduta; interiorizei esta forma de estar e ser perante os outros e a sociedade em geral.
Teve méritos o que recebi, certamente. Aprendi a ser respeitadora, a saber acatar, a ser submissa, a reconhecer e valorizar qualidades, a ouvir e considerar o "outro", em paridade, sem me sentir superior ou inatingível, pessoal ou intelectualmente. Foi-me exigido ser responsável, foi-me pedido "ser capaz"...quiseram que tivesse forças para segurar o "mundo" que me punham nas costas...

Teve consequências gravosas também...sem dúvida.
Até hoje, muitos aspectos e episódios do meu percurso, foram pautados e marcados por uma personalidade ( a minha), que me acarretou infelizmente alguns desgostos, alguma infelicidade e insatisfação, alguma impreparação para a vida real, aquela que me esperava "cá fora" e a que não tive acesso, para a qual não me traquejei e escorei, nessa "redoma" ou "casulo" pré-definidos, em que me formei.

Tive eu depois que educar uma geração, onde começaram a dar-se os primeiros passos de "democratização" da educação. Uma geração de crianças e adolescentes, com seres a juzante absoluto do que vivi, seres questionantes, seres recalcitrantes, imperativos, exigentes, avaliadores, juízes...
E pais a "aprender", enquanto educavam...Pais a "tactear", na angústia do desacerto, pais a serem questionados e a questionarem-se, pais a interrogarem-se no medo do erro.
Mas, ainda assim, nunca ausentes, nunca capitulantes, fomentando o diálogo como podiam e sabiam, tentando nunca recusar uma explicação ou resposta...
Pais que pediam desculpa se consideravam ter falhado, quase impondo-se uma justificação para tudo, frente àqueles "diabinhos".
Decididamente, pais que erravam, tentando acertar...

Tive que educar uma geração que, penso, esticou a "corda" quanto pôde, testou até à exaustão, desafiou ostensivamente, fez "braço de ferro" perante quase tudo, foi pouco submissa, excessiva e prematuramente personalizada, pôs tudo em causa, inclusive os próprios caminhos em que era educada.
Falava-se demasiado em "repressão", "invasão de espaço", "desrespeito pela privacidade", "prepotência" de pais mais afoitos, ausência de disponibilidade para ouvir e compreender, "cercear de sonhos e liberdades" (quando se nos afiguravam mais "veleidades", "utopias" ou "desafios", do que sonhos)...

Eis hoje aí, essas gerações a educarem outras...
De novo...o ciclo a cumprir-se.

Talvez se comecem agora a equilibrar os dois extremos;
oiço os pais de hoje falar em disciplina e respeito, oiço exigirem educação, métodos de trabalho e responsabilidade; oiço os pais de hoje, preocupados em não falharem no interesse, no acompanhamento permanente; vejo os pais de hoje presentes, ainda que cansados, no lazer e no trabalho dos filhos, procurando conhecer (sem devassar), da escola, dos tempos livres, dos colegas e amigos, dos namorados; procurando auscultar dificuldades, incentivando nos desaires, exultando com as vitórias; presentes pela positiva, valorizando as capacidades, não penalizando excessivamente as derrotas, estando ao lado; utilizando uma pedagogia de construção e de responsabilização, propiciadora da elevação da segurança e auto-estima, cúmplice na exigência mas também no afecto.
E com isso, mais soltos, menos "assustados", mais desinibidos, mais convictos (como se sempre tivessem sabido a lição), menos auto-flagelados, culpabilizados, angustiados...e por isso, mais felizes, num "estado de graça" de uma missão que se cumpre e desenha com alguma leveza, muita entrega e sem grandes sobressaltos.

Em suma, vejo os pais de hoje mais assumidos...como se ser pai não fosse o "hobby" mais complicado e difícil do Mundo!!...


Anamar



Este post é particularmente dedicado à minha mãe (que o não lerá...) e à minha filha, que já é mãe (e talvez o leia...). Para elas, vão as minhas rosas...







Sem comentários: