quarta-feira, 1 de agosto de 2012

" O MAR "


Vim até ao mar ...

Eu sou filha do mar.  Não deste que tenho à minha frente, mas do mar da minha terra, que é feito de ondas de trigo, onduladas pelo vento, com papoilas a salpicá-lo aqui e ali .

Eu sou uma mulher de sorte.  Tenho três mares na minha Vida :  este, verde, turquesa e cinzento, que lá longe se confunde com um céu que se esbate em todos os tons de azul ;  este, que tece uma renda de espuma na areia ...
Tenho o mar de ouro do meu Alentejo tão distante, mas tão perto no coração, e também tenho o bruxulear das chamas numa lareira, que crepitam num marulhar entendível.
Esse, é o meu "mar de Inverno" ...
A água, a terra e o fogo ... dentro de mim !...

Há coisas que parecem mas não são, e coisas que não parecem e afinal eram ...
A Vida não é muito mais.  É feita de equívocos silenciosos, feita de esperança, que é como estes castelos de areia que se constroem na rebentação.
É feita de sonhos, que como farrapos de nuvens, a brisa transporta para longe, e com elas a paz também vai, porque a paz sempre acompanha o sonho !
A paz ... esta que eu estou sôfrega de encontrar ... Que respiro entre dois penedos neste areal, feitos para mim, à minha medida, onde construo o meu nicho de silêncio, local do meu encontro comigo mesma, por cada dia que desço , e em que me sinto por momentos, dona do Mundo.

A minha música, lânguida e doce, magoada e embaladora ;  um livro que me leva para o outro lado do Mundo, na fantasia das letras ;  a aragem que perpassa e nem sequer gaivotas transporta, e a profundidade intimista, incessante, deste vai-vem de maré baixa ...

Eu já não lembrava a força do mar !
Eu já não lembrava a rudeza com que nos pega e nos mostra quem "manda".
Eu já não lembrava o frio de uma água que abençoa e aplaca o calor deste sol, que nos acaricia doutra forma.
Falésias à esquerda, à direita ... penhascos orgulhosos e desafiadores, cantos de amor e cumplicidades entre rochedos ...

Outra Vida para além desta, injustamente para além desta.
A real.  Aquela que se faz entre quatro paredes de um quarto, que é o Mundo, e não mais.  Quatro paredes que sufocam, porque teimam em se aproximarem umas das outras, em madrugadas de insónias; 
e estreitando, estreitam-me e cortam-me o respirar, e sufocam-me a garganta e espremem-me o coração !...

É então, no escuro da noite, no breu que cerra sempre tudo à minha volta, que todos os fantasmas me visitam, me aterram, trazem nas costas o saco com toda a amargura da Vida, e teimam em ficar,  mesmo que em lágrimas, lhes suplique que partam ... que partam e me esqueçam ... esqueçam que eu ainda existo!

Maré que vai, maré que vem ... sal que expurga, purifica, limpa até à alma ...
Como eu queria que ele me pudesse apagar a mente e o coração !!!...

O meu signo é de água, o meu ascendente é de água ... os horizontes vastos e ilimitados ... razão de vida.
Não tenho baias ou barreiras ;  vedações ou muros não me confrontam, a minha alma não aceita redes ou malhas, grilhetas ou grades, quartos com paredes que se estreitam ...
A minha alma é devassa, é pecadora, é desafiadora, todos os dias.  Os meus limites não têm limites.  Aceitam apenas os que o coração lhes dita ... de resto são livres, são soltos, como barco sem âncora ou fateixa, em mar alto !

A onda vem, a onda vai ...  A onda que vai já não vem.  O mar que traz, é o mar que leva !...

Tal como o amor ...  Quando vai não volta mais, feito onda da maré cheia !
Apenas deixa na areia os búzios, as conchas, as algas, as luas e as sereias que fizeram parte de outras histórias ... que navegaram connosco, por outras costas de mistério !!!


Anamar

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