terça-feira, 2 de outubro de 2012

"APONTAMENTO"



Nem sei por que estou aqui ... afinal são seis horas da manhã, há hora e meia que não durmo, e "ela"  chamou-me ...  Decididamente chamou-me!

A minha casa acesa com uma luz clara, mansa, silenciosa, levou-me à vidraça. Claro que ela era dona do céu. Ela já ofuscava a luz do dia  que ainda  não espreitava,  e a das estrelas que esfregavam os olhos de sono ... e de espanto.
Ela, e um pássaro branco e roçagante, dividiram o céu escuro. Talvez uma coruja em regresso a casa !

Não tenho nada para dizer, não tenho nada sobre que valha a pena fazer-vos perder tempo. Só que, agora é assim ... as madrugadas trazem-me quase sempre à realidade antes da hora, começam a massacrar-me os miolos com demasiada antecedência ... E entre  rebolar-me  naquela cama vazia, e vir "à janela"... resolvi vir abrir as cortinas e espreitar-vos desse lado, na tal hora mágica, de silêncio absoluto, de seres inquietos como eu, que se passeiam por aqui.
Comungamos das noites, dividimos as madrugadas, ouvimos o silêncio.
 Eles lá ... eu, cá ... ainda!...

Há de facto algo estranho, na noite.
A noite é uma entidade que se impõe ... tem os seus segredos e as suas histórias.
A noite é o albergue dos que circulam contra-ciclo quase sempre.
Claro que há quem conviva com ela, porque está assimilada nas suas vidas, por imposições profissionais.  Mas mesmo aí, eu acho que as cumplicidades que se geram nas noites e nas madrugadas silenciosas, é muito particular.  Não tem a ver com as cumplicidades desnudas, partilhadas no buliço dos dias confusos.
Diria que têm uma força especial. A força do comungado num segredo que o não é.

Bom, começam a circular os primeiros combóios, que certamente levam gente que adoraria estar numa cama como a que eu rejeitei.
A vida de quem tem vida!...
A minha mãe, seguramente, também já está levantada há algum tempo.  Essa aí, tem pressa em sorver o resto do tempo que lhe atribuiram para ver luas sobre luas, por enquanto.
Essa aí, faria de cada vinte e quatro, quarenta e oito horas, para que a estrada ainda se lhe alongasse ... porque ela ama viver.
De facto, tenho poucos dos genes dela !...

E vou voltar para o segundo "round" de mais uma noite sem história ... ou com tantas histórias, que me fundem a cabeça, e me trazem à janela, para lhe render homenagem ... a ela, à rainha imponente da noite ... e ao pássaro branco, talvez uma coruja ... em rota de "casa"...

Anamar

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