sexta-feira, 29 de abril de 2011

"GOD SAVE THE QUEEN !...."



Dia modorrento, tal como eu!
Acinzentado, um sol com vergonha de se anunciar...parece que cá e lá...
"Lá"... refiro-me a Londres, Londres refiro a chuva que haviam previsto cair, para "abençoar" aquele casamento, que de tão falado já vai estando gasto!

Café quase deserto ( as pessoas resolveram ficar placidamente em casa, a desfrutar da exaustiva reportagem de todas as televisões, comodamente nos sofás, fazendo "zapping" com frenesim, não fosse alguma das estações ter captado melhor este ou aquele flash imperdível ) ;

Eu, fui acordada e como consequência "atirada" para a rua, pelo telefonema, exactamente de Londres, do meu amigo David, que tem exultado com o casamento do seu príncipe.
David brincava a perguntar-me se eu já estava em Westminster, que não me havia encontrado, se eu havia recebido a sua encomenda esta semana, com bolinhos, chocolates, a adequada bendeirinha e até "wedding drops for cats", para a Rita...tudo à volta do "circo" mediático  de "souvenirs", montado a propósito do evento.
Claro que recebi, claro que "desgraçadamente" até já comi alguma coisa...enfim, o David, de meu "bom amigo" anda a passar-se para um verdadeiro "amigo da onça", colocando-me à força em regime de "engorda".

Bom, o casalzinho do ano, quiçá do século, realmente é merecedor de simpatia.
Quer William, quer Kate, são figuras carismáticas, pela aproximação inevitável a Diana, pela aproximação inevitável ao povo, à gente anónima que "acampou" literalmente, há vários dias, para não perder pitada da união dos seus príncipes e de os prestigiar.

São realeza e parecem gente comum. São simples de postura e simpatia.
Não têm a frieza dos britânicos, pior ainda, das figuras quase fantasmagóricas (algumas), da coroa tradicional que por lá ainda está.
Por eles parece perpassar uma lufada de ar fresco, de despretensiosismo, de quebrar de regras e rigidez de protocolos bafientos da monarquia...

Digamos que por eles, Diana fará finalmente a "sua justiça"!!...

A nós por aqui, ancestrais aliados que sempre fomos dos britânicos, estamos de tal modo "de tanga", que nem o "nosso D. Duarte", de tanga  poderia comparecer ao evento ...
Tudo nos corre às avessas e nem sequer temos um casamentozinho que nos possa valer, à entrada de algumas divisas, que tanto jeito nos fariam!!...

Resta-nos atordoarmo-nos com as imagens sempre de "conto de fadas" que envolvem de mistério e magia qualquer casamento, mais ainda se for  de uma princesa.... e desejar a Kate que

                           "GOD MAY SAVE HER!!..."

Anamar                                                                                                        

"REPEGANDO..."

 

Falava-vos ontem do artigo de Clara Ferreira Alves, ao semanário EXPRESSO, há algum tempo atrás, infelizmente sempre actual.

Aqui vo-lo transcrevo e deixo à vossa consideração/ reflexão.

Só me ocorre dizer: "POBRE PAÍS!!..."


Clara Ferreira Alves

Mas vale MESMO a pena ler... Aqui fica:

"Não admira que num país assim emerjam cavalgaduras, que chegam ao topo, dizendo ter formação, que nunca adquiriram, que usem dinheiros públicos (fortunas escandalosas) para se promoverem pessoalmente face a um público acrítico, burro e embrutecido.

Este é um país em que a Câmara Municipal de Lisboa, desde o 25 de Abril distribui casas de RENDA ECONÓMICA - mas não de construção económica - aos seus altos funcionários e jornalistas, em que estes últimos, em atitude de gratidão, passaram a esconder as verdadeiras notícias e passaram a "prostituir-se" na sua dignidade profissional, a troco de participar nos roubos de dinheiros públicos, destinados a gente carenciada, mas mais honesta que estes bandalhos.

Em dado momento a actividade do jornalismo constituiu-se como O VERDADEIRO PODER. Só pela sua acção se sabia a verdade sobre os podres forjados pelos políticos e pelo poder judicial. Agora contínua a ser o VERDADEIRO PODER mas senta-se à mesa dos corruptos e com eles partilha os despojos, rapando os ossos ao esqueleto deste povo burro e embrutecido.

Para garantir que vai continuar burro o grande cavallia (que em português significa cavalgadura) desferiu o golpe de morte ao ensino público e coroou a acção com a criação das Novas Oportunidades.


Gente assim mal formada vai aceitar tudo e o país será o pátio de recreio dos mafiosos. A justiça portuguesa não é apenas cega. É surda, muda, coxa e marreca. Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro, e nenhum português se preocupa com isso, apesar de pagar os custos da morosidade, do secretismo, do encobrimento, do compadrio e da corrupção. Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo normal" e encolhem os ombros. Por uma vez gostava que em Portugal alguma coisa tivesse um fim, ponto final, assunto arrumado. Não se fala mais nisso. Vivemos no país mais inconclusivo do mundo, em permanente agitação sobre tudo e sem concluir nada. Desde os Templários e as obras de Santa Engrácia, que se sabe que, nada acaba em Portugal, nada é levado às últimas Consequências, nada é definitivo e tudo é improvisado, temporário, desenrascado.


Da morte de Francisco Sá Carneiro e do eterno mistério que a rodeia, foi crime, não foi crime, ao desaparecimento de Madeleine McCann ou ao caso Casa Pia, sabemos de antemão que nunca saberemos o fim destas histórias, nem o que verdadeiramente se passou, nem quem são os criminosos ou quantos crimes houve.

Tudo a que temos direito são informações caídas a conta-gotas, pedaços de enigma, peças do quebra-cabeças. E habituámo-nos a prescindir de apurar a verdade porque intimamente achamos que não saber o final da história é uma coisa normal em Portugal, e que este é um país onde as coisas importantes são "abafadas", como se vivêssemos ainda em ditadura.

E os novos códigos Penal e de Processo Penal em nada vão mudar este estado de coisas. Apesar dos jornais e das televisões, dos blogs, dos computadores e da Internet, apesar de termos acesso em tempo real ao maior número de notícias de sempre, continuamos sem saber nada, e esperando nunca vir a saber com toda a naturalidade.

Do caso Portucale à Operação Furacão, da compra dos submarinos às escutas ao primeiro-ministro, do caso da Universidade Independente ao caso da Universidade Moderna, do Futebol Clube do Porto ao Sport Lisboa Benfica, da corrupção dos árbitros à corrupção dos autarcas, de Fátima Felgueiras a Isaltino Morais, da Braga Parques ao grande empresário Bibi, das queixas tardias de Catalina Pestana às de João Cravinho, há por aí alguém quem acredite que algum destes secretos arquivos e seus possíveis e alegados, muitos alegados crimes, acabem por ser investigados, julgados e devidamente punidos?

Vale e Azevedo pagou por todos?
Quem se lembra dos doentes infectados por acidente e negligência de Leonor Beleza com o vírus da sida?
Quem se lembra do miúdo electrocutado no semáforo e do outro afogado num parque aquático?
Quem se lembra das crianças assassinadas na Madeira e do mistério dos crimes imputados ao padre Frederico?
Quem se lembra que um dos raros condenados em Portugal, o mesmo padre Frederico, acabou a passear no Calçadão de Copacabana?
Quem se lembra do autarca alentejano queimado no seu carro e cuja cabeça foi roubada do Instituto de Medicina Legal?

Em todos estes casos, e muitos outros, menos falados e tão sombrios e enrodilhados como estes, a verdade a que tivemos direito foi nenhuma.

No caso McCann, cujos desenvolvimentos vão do escabroso ao incrível, alguém acredita que se venha a descobrir o corpo da criança ou a condenar alguém?
As últimas notícias dizem que Gerry McCann não seria pai biológico da criança, contribuindo para a confusão desta investigação em que a Polícia espalha rumores e indícios que não têm substância.

E a miúda desaparecida em Figueira? O que lhe aconteceu? E todas as crianças desaparecida antes delas, quem as procurou?

E o processo do Parque, onde tantos clientes buscavam prostitutos, alguns menores, onde tanta gente "importante" estava envolvida, o que aconteceu?
Arranjou-se um bode expiatório, foi o que aconteceu.

E as famosas fotografias de Teresa Costa Macedo? Aquelas em que ela reconheceu imensa gente "importante", jogadores de futebol, milionários, políticos, onde estão? Foram destruídas? Quem as destruiu e porquê?

E os crimes de evasão fiscal de Artur Albarran mais os negócios escuros do grupo Carlyle do senhor Carlucci em Portugal, onde é que isso pára?

O mesmo grupo Carlyle onde labora o ex-ministro Martins da Cruz, apeado por causa de um pequeno crime sem importância, o da cunha para a sua filha.

E aquele médico do Hospital de Santa Maria, suspeito de ter assassinado doentes por negligência? Exerce medicina?

E os que sobram e todos os dias vão praticando os seus crimes de colarinho branco sabendo que a justiça portuguesa não é apenas cega, é surda, muda, coxa e marreca.

Passado o prazo da intriga e do sensacionalismo, todos estes casos são arquivados nas gavetas das nossas consciências e condenados ao esquecimento.

Ninguém quer saber a verdade. Ou, pelo menos, tentar saber a verdade.

Nunca saberemos a verdade sobre o caso Casa Pia, nem saberemos quem eram as redes e os "senhores importantes" que abusaram, abusam e abusarão de crianças em Portugal, sejam rapazes ou raparigas, visto que os abusos sobre meninas ficaram sempre na sombra.

Existe em Portugal uma camada subterrânea de segredos e injustiças , de protecções e lavagens, de corporações e famílias , de eminências e reputações, de dinheiros e negociações que impede a escavação da verdade.

Este é o maior fracasso da democracia portuguesa."
                                                                                            Clara Ferreira Alves - "EXPRESSO"
Anamar

quinta-feira, 28 de abril de 2011

"UM SONHO SONHADO P'LA METADE !...."

Uma amiga enviou-me um e-mail com a transcrição de um artigo de opinião de Clara Ferreira Alves.

Chamava-se ele "O MAIOR FRACASSO DA DEMOCRACIA PORTUGUESA" e foi publicado no semanário EXPRESSO.
Talvez alguns o tenham lido.

Clara Ferreira Alves não carece obviamente de apresentação, quer como personalidade, mediática que é, quer como jornalista, comentadora política, clara, como o seu próprio nome, contundente, esclarecida, desassombrada, pragmática.

Ela não fala para elites, linguagem hermética, precisando de descodificação. Ao contrário, tem um discurso escorreito, objectivo, esclarecedor.
Depois de a ouvir chamar as coisas pelos nomes, é usual concordar-se com a sua exposição e forma de análise crítica construtiva.

Durante a tarde, e porque a minha mãe se encontra convalescente aqui em casa, para a distrair, liguei o televisor, tentando cativá-la para o programa que passava, e assim, retirá-la da apatia que tem estado a instalar-se-lhe.
o programa era um filme/documentário sobre o 25 de Abril de 74, os acontecimentos que o dominaram...os bastidores da História...

A minha mãe é a tal que quer viver "até ver o país reerguer-se", como vos contei...e ficou "presa" ao écran, apesar do mal-estar que ainda a domina.

Eu, no PC, de costas para o televisor, ia ouvindo, decibéis muito acima do razoável ( o que me deixava os miolos quase fritos ), histórias da História.

Desde o discurso inflamado de então, aos slogans gritados em uníssono por multidões, que eram verdadeiras correntes com elos indissolúveis, às canções/bandeira erguidas por uma só voz, por um só povo, por uma só esperança...de tudo me chegava aos ouvidos.
As figuras carismáticas, rostos da revolução dos cravos, eram os genes de uma nova era que se pretendia de mudança, de fé, de muita esperança!

As cartas estavam finalmente na mesa, o "jogo" começava a fazer-se, mas ninguém, seguramente nesse dia, de todos os que anonimamente se felicitavam nas ruas, sorriam, se abraçavam, numa alucinação colectiva, acreditaria, que trinta e sete anos depois, a revolução de hoje, como lhe ouvi chamar, com bastante propriedade aliás...é a Revolução dos ( Es ) cravos!!!..

E senti dentro de mim, a raiva da criança que acreditou no sonho de alcançar a lua, a raiva da fé gorada nos poderes de Aladino e da sua lâmpada, ou tão só a fraude que se sente dentro do peito, quando demos tudo, mas tudo mesmo, por um sonho ou miragem que pareceu estar ali tão perto, e que afinal, não passou disso mesmo, uma miragem, um sonho sonhado p'la metade!...

Os custos emocionais acarretados para dentro de cada um de nós, acredito serem desmedidos, o fracasso para que fomos arrastados, sem tamanho...

E a "geração do desenrasca", que creio sermos também nós, os mais velhos, confrontados com o curso desta água podre por entre escolhos, faz como eu...fecha o televisor para não chorar!!!....

Anamar

domingo, 24 de abril de 2011

"OUTRO" 25 DE ABRIL.....



O meu país de Abril virou Inverno!
O meu país de esperança e cravos rubros
virou sonho, virou nuvem, virou mágoa...
O meu país azul aqui tão perto!

A canção de "ninar" não se ouve mais...
Hoje as mães de Abril não têm pão...
O meu país de Abril virou Inferno,
e não há já, quem diga "NÃO" !...

O meu país de esperança e cravos rubros
está a parir dores, injustiças, solidões...
O sonho já sonhado estiolou,
Até de Abril, se calaram as canções!...

Virou sonho, virou nuvem, virou mágoa,
A gaivota não voa mais no nosso céu!
Pobre gente, pobre terra de diáspora,
que hoje nada tens que seja teu!!...

O meu país azul aqui tão perto
E tão longe que parece que o inventei
Os cravos não existem, não perfumam...
Mas juro, que nele um dia acreditei!!

O meu país de Abril virou Inferno!...
O meu país de esperança e cravos rubros...
Aqueci-o, embalei-o junto ao peito...
Mas perdeu-se ... mesmo estando aqui tão perto!!!....

Anamar

sábado, 23 de abril de 2011

"E QUANDO JÁ NÃO HÁ AMANHÃ??..."

Outra madrugada "desgramada" sem sono durante horas e horas, em que a pestana corrida, não impede que a vigília se instale por debaixo dela. O pensamento voa, voa por debaixo também, e tudo, mas tudo é "desencantado" com as cores da noite, que como sabem, nunca são muito coloridas...

Pensava eu, nestas deambulações, que há quase um mês o Norberto "bateu a porta"...
Do Norberto já vos falei. Continua-me no coração...
A esta hora já ele matou a curiosidade que me transmitiu na minha última visita a Sta. Maria : "Ver como era aquilo lá do outro lado!"..
É portanto, muito mais "sábio" que todos nós que por aqui continuamos em Via Sacra, apesar da Semana Santa estar a acabar!...

Neste momento reflicto que ao contrário do que devia, a minha hipermetropia está a aumentar a olhos vistos...
Passo a explicar: "Hipermetropia é um defeito da visão que prejudica a visão ao perto, a curta distância..."
Pois é...eu "vejo" muito melhor para trás, o que por lá ficou, e também o que há-de vir, que é como quem diz, trago sempre o futuro antecipado, ao pescoço, como a moeda de Bali que o Miko me ofereceu na despedida.

E ver o presente, o hoje, o agora, que é lugar comum saber-se ser o "certo", o único certo....népia!

E depois, quando menos se espera, dão-nos ordem para "bater a porta" e confrontamo-nos com o ridículo que foi, a dramatização de tudo isto! Porque, nesse dia, inapelavelmente, fica tudo por fazer!!...

Pensava eu...se calhar, no frigorífico do Norberto ainda ficou o resto do jantar da véspera, fruta na fruteira, a viola encostada a um canto, acreditando pacientemente que ele de novo a faria vibrar, aquele CD que era para ouvir depois, aquele filme que estava na "calha" para ser visto ( se calhar em boa companhia ), o vinho que não bebeu...e com um bocado de pouca sorte, alguma camisola ainda dependurada no estendal...

Depois, houve as palavras que sempre adiou para dizer, as gargalhadas que não deu, apesar de o Norberto ser de gargalhada fácil, de riso franco, as lágrimas que talvez tenha chorado às escondidas...e até o almoço que havíamos combinado, espera "sine die"...mas "sine die" mesmo...

Não sei como vou resolver isto...O Paris continua à nossa espera, a promessa ficou a pairar à espera de melhores dias...e agora??
Vou almoçar sem o Norberto?
Parece-me injusto! Parece-me uma "pirraça" de mau gosto...uma aleivosia do caraças...Que droga!!!...

Se fosse eu, então...acho que "TUDO" tinha mesmo ficado por fazer!!
Como sabem, as "minhas coisas" sempre esperam melhor oportunidade, que parece nunca chegar.
Eu deixaria tudo dependurado nos "cabides" da VIDA...seguramente...

Anamar

quarta-feira, 20 de abril de 2011

"FELIZ PÁSCOA !!...."

Há dias atrás "postei" algo sobre as Páscoas, as minhas Páscoas.
Aquelas que remontam à doçura das queijadas, das merendeiras, dos bolos de folha, dos folares do meu Alentejo, e não tanto às amêndoas impessoais de hoje em dia...

Até porque aquelas eram feitas com o carinho de mãos familiares, em casa de avós, e cozidas em forno comunitário da vila.
Aquelas, encerravam em si o sol de Abril, os cheiros dos campos, o aroma das flores pelos quintais, pelos jardins, pelos vasos junto às soleiras ou suspensos das janelas.
Aquelas, encerravam os meus poucos anos e a minha ignorância do "itinerário" que me aguardava...
Encerravam a família ainda incólume em torno de amores comuns, alegrias e preocupações comuns, afectos que eram nossos...

Não me vou por isso, repetir, nem maçar-vos com os meus eternos "ataques de saudosismo"....

Vim aqui hoje falar-vos da Páscoa, tão somente para vos desejar que a vossa, seja absolutamente "GREAT and AMAZING!!"...acho que estas duas palavras nos enchem a boca...e traduzem fielmente o que quero para vocês: Uma Páscoa absolutamente   ES - PAN - TO - SA  !!!!.....



Anamar

segunda-feira, 18 de abril de 2011

"ESTE MUNDO NÃO É PARA VELHOS !!..."

Começo a constatar uma nova realidade que nunca antes havia observado neste país.
À porta dos supermercados, chefes de família, presumo, com um saco de plástico na mão, silenciosamente não pedem, mas mostram  o saco vazio aos que entram, num esgar de desespero.
Mostram assim que não pedem dinheiro, mas alimentos...

Também nos cafés, observo muitos homens válidos, na casa dos quarenta, cinquenta anos, a meio do dia, numa hora em que o expectável seria estarem nos empregos ou em trabalho, ociosamente frente a uma chávena vazia, a lerem o jornal da casa, ou mesmo apenas de olhos perdidos no vácuo.
Outros, nem isso... Estão silenciosamente entristecidos, silenciosamente vazios, silenciosamente sem rumo. Falam sozinhos às vezes...palavras ininteligíveis...

Na mesa à minha frente, um casal jovem, quase crianças eu diria, com aspecto extremamente carenciado, também toma um café, com um recém-nascido num carrinho. Percebi que acabara de sair da maternidade.
Ela, perdera o viço dos verdes anos, da juventude a que tinha direito...Ele, ora em "estado de graça" com aquele filho recém caído nos seus braços, não tardará a consciencializar que deverá ter capacidade de resposta, daqui para a frente, agora que aquele ser saíu do ventre da mãe...

Por que terá de ser a pobreza feia? Não chegaria já ser pobreza?...
Por que se continuam a colocar crianças neste Mundo, exactamente neste Mundo actual, quando os próprios pais nem a si se bastam?...
Até quando aquele casal será casal?...
Até quando aquele casal se manterá unido em torno daquela filha, que não pediu para estar cá?...

A mãe, parida de fresco, um "monstrinho"...
Roupa inadequada (não deverá ter outra provavelmente), cabelo oleoso, aspecto totalmente descuidado, nem um só resquício de alegria no olhar, nem por aquela "trouxinha" pequenina, que agora lhe cabe quase numa mão...
O pai, em fato de treino, tipo "farda" de trabalho...
Levaram o carrinho e foram eles próprios, para a zona de fumadores do café, sem perceberem o "crime" que cometiam.
Foram, porque iam fumar. Sempre se arranja dinheiro para tabaco!!...

Ontem passei a tarde num banco de um hospital civil desta cidade. Fui com a minha mãe, que carecia de exames com carácter de urgência.
A análise sociológica do que nos desfila pela frente nesse ambiente, é arrepiante, é indescritível, é esmagadora, fantasmagórica!...
Os utentes, normalmente pessoas carenciadas, que sempre o foram, são-no mais neste momento, em quantidade e em qualidade.
Os casos humanos de pessoas que "estrebucham" contra a doença, pessoas que sem outros recursos, não têm condições de pagar a "saúde" privilegiada...dói...

O desespero dos que esperam horas intermináveis para que os atendam, para que se lembrem que ali aguardam impacientemente...é intraduzível...
A dor que os assola, aumenta, porque o "abandono" parece abater-se sobre eles e a desesperança potencia o sofrimento.
Não há posição nas cadeiras, não há braços mais, para suporte de cabeças que pesam chumbo, os cheiros de gente humana em putrefacção paralisam... há uma desistência a dominar...

E as horas fazem-se sobre horas...e a tarde faz-se dessas horas...e as chagas que são do corpo, alastram-se até à alma!!!
A pobreza é feia, o sofrimento é feio, este povo está a ficar feio, este país também...o Mundo, horrível !!!...

Fui assaltada pelo nome daquele filme que vi em tempos e que neste momento "me encaixa" na perfeição:

     "ESTE MUNDO NÃO É PARA VELHOS!!!....."

Anamar

sábado, 16 de abril de 2011

"PÁSCOAS....PÁSCOAS...."



A Páscoa está à porta.
Sempre foi uma época do ano, algo incaracterística para mim.
Mais...uma festividade meio amorfa... 

Exceptuando as Páscoas da minha meninice ( Páscoas de Alentejo, em casa ociosa de avós, como já vos contei... essas sim, com "rituais" a cumprir por ainda ser totalmente "comandada" pelos regimes familiares impostos à época ), as restantes não tinham normalmente nada assinalável.

A maior parte, já lá vão bastantes anos, pautavam-se por férias na Beira Alta, em casa habitualmente cerrada e que demorava alguns dias a tornar-se "habitável".
Penso que essas, apesar de tudo, eram mais Páscoas para as minhas filhas, que em regime escolar interrompido, tinham pela frente as amizades de infância com os intermináveis jogos de cartas, as tardes fora de casa e a despreocupação dos verdes anos.
Eu, tinha outras panelas e outros tachos, algum tempo partilhado com o campo, o ar livre, as flores e os verdes a deitar as primeiras cabeças de fora, com o sol,  e por vezes o calor a destempo e nada de importante.
A "vidinha" de sempre...

Hoje, a Páscoa ainda é mais vazia.

Nem o Alentejo com as recordações mais doces, cheirosas e "quentes" da minha terra ao sul, com os poucos anos que então tinha, com a vida comprida, comprida pela frente...com a fé inabalável de que tudo seria sempre pelo menos tão doce quanto as amêndoas que se comiam...

Também não há mais Páscoas naquela casa que está lá nos campos da Beira, com flores brancas, glicíneas, magnólias, alecrins, alfazemas, plantados por mim e lá deixados, a viver Páscoas esquecidas de uma família que o foi...
Nem "Visita Pascal" de cruz e caldeirinha, de campainha e flores à porta...a convidar os vindouros...

Estou a ficar muito parecida com o meu pai neste tipo de vivências. Ele sempre disse (e repito-me, seguramente), que "os dias são todos iguais...nós é que os inventamos diferentes..."
Deve ser...cada vez mais acredito que a dureza da vida nos conduz a esta indiferença pálida e modorrenta, a esta catalepsia entediante;
Cada vez mais acredito que as cicatrizes que se vão "plantando" nos nossos corações...não têm capacidade nunca para florir de novo.

Fico nostálgica, contudo...
Este raio destes "separadores" que arranjaram para dividir o ano em "fatias", só servem para nos lembrar que mais um ano já foi (ainda ontem era Páscoa...), que menos um ano também já...para cada um de nós...

E que se calhar não haverá lugar a mais Páscoas de "amêndoas" que não as do supermercado, mais Páscoas de alecrins, rosmaninhos, giestas e alfazemas aromáticas, que polvilhem de perfume e cor, os corações mais descoloridos e bafientos que nem o meu...mais Páscoas com esperança de alguma coisa, de qualquer coisa que valha realmente a pena viver!!...

Anamar

segunda-feira, 11 de abril de 2011

"TALVEZ SIM...OU TALVEZ NÃO..."



E Saramago disse: "Não se morre por amor... mas não se vive sem amor !..."

De repente esta frase caiu-me uma outra vez, repescada que o foi de um post meu com mais de dois anos... e de uma forma inesperada associei-a ao que tinha sido a minha "reflexão maluca", enquanto tentava pôr a "fúcia" minimamente apresentável, frente ao espelho, ao levantar.

É domingo, mais um, meio vazio, meio despido, com um sol a desafiar-nos rua, em que o meu programa de festas previsto, será ir ao Hospital visitar a minha mãe e talvez fazer a minha caminhada, se a coluna mo permitir ( ando a desafiá-la indecentemente e a testar os seus limites...).
Essa, a parte "desanuviada" da coisa, porque o ar puro, os verdes salpicados de flores humildes por aqui e por ali, são verdadeiro "carregador" de baterias.

Dizia eu que, pensava ao ver-me, revendo-me dos vários ângulos possíveis, sem truques ou manigâncias, no que é de facto a minha vida actualmente, meio dormente que me sinto...

Os meus dias são cada um , com aquilo que me pode oferecer ;
sou rica, muito afortunada mesmo porque estou viva ( dizem ), tenho saúde ( posso considerar que sim ), tenho uma família linda que amo e me ama ( não tenho um resquício de dúvida ), tenho amigos que não mereço, mas que o são ( não muitos, mas em qualidade ), tenho garantida em termos económicos a sobrevivência, com alguma qualidade e dignidade ( pelo menos por ora )...e depois tenho "fogachos postiços", pensos rápidos que não são mais que isso, a curar cancros instalados no coração...

E como com pensos rápidos não se curam cancros, vou fazendo de conta que pinto o mundo com cores fortes e emocionantes, cada dia "de per si", vendo exactamente esses dias indo, indo e acreditando mais e mais em Saramago!!

Até quando, é o que me pergunto, esta mornidão de águas paradas, este algo desinteressante dos dias, ainda que ensolarados??!!..
.
Espera-me o quê?
Ver o António, a Vitória e o Frederico crescerem... ver as minhas filhas a "atinar" na vida... ver a "Rita" a envelhecer e qualquer dia, inevitavelmente a "ir-se" à procura do Óscar???...
Ver a minha mãe também inevitavelmente na recta final da sua maratona???...
Ver os amigos com as maleitas, os desgostos com que o tempo não desiste de nos presentear, com o cansaço a instalar-se, manquejando paralelamente a mim???...
Ver-me a mim própria, manquejando, paralelamente a eles???...

Que as Primaveras promissoras antecederão Verões, talvez já não tão ensolarados como antes, porque a minha vontade, a força e a saúde também já não serão "essas coisas"???...
Que os Invernos e os Outonos vão tornar o meu quarto solitário, ainda mais e mais escuro???...

Meu Deus... se eu fosse Saramago teria escrito : " Não se vive sem amor...e morre-se todos os dias um pouquinho por falta dele !!!...."

Anamar

sábado, 9 de abril de 2011

"UMA MULHER SIMPLES"



A minha mãe está hospitalizada.
Faz noventa anos na próxima segunda feira dia 11...mas "requereu" mais qualidade de vida.
Para isso, foi submetida a uma intervenção cirúrgica, estoicamente, sem desistência...

Acho que eu consegui estar mais apreensiva e nervosa que ela. Ela, já só "via" como será tão melhor a sua vida daqui para a frente.
Daqui para a frente...espantoso...noventa anos e para ela (e eu acredito piamente que sim), ainda terá muito "daqui para a frente" para viver!

Nunca foi mulher de recuar nem voltar a cara a nada, como já aqui referi neste meu "canto".
A minha mãe sempre foi uma mulher de coragem, uma mulher de vida e não de morte!
Para ela a vida não é de exigências, fica feliz com pouco...talvez seja mesmo esse o segredo!
Feliz porque está "muito bem instalada" no hospital, feliz porque todo o pessoal hospitalar é muito atencioso e carinhoso para com ela, feliz porque lhe deram banho, a pentearam, lhe puseram um "perfuminho" e até lhe lavaram os dentes....pasme-se!!!

Quer, porque quer viver!

Confessou-me há dias que quereria muito ver o percurso dos bisnetos, quereria muito ver "o seu país" reerguer-se....o que me fez rir e dizer-lhe prontamente: "Mãe, então prepare-se para viver até aos cento e cinquenta!!!!  rsrsrs...

Está no hospital a pensar nas "suas" sardinheiras que a esperam do outro lado, no jardim, reclamando água de rega.
Congemina regressar o quanto antes à sua caminhada diária, à sua vida normal!

Consegue sempre transformar o pouco em muito, o menos bom em bom; as dores passam-lhe depressa, antes que no-las transmita e nos preocupemos...

Esta noite, soube há pouco, teve um episódio de confusão cerebral, e porque não estava devidamente acautelada a situação preventiva, mesmo tendo o soro ligado à veia e a algália colocada, para não incomodar ninguém, resolveu sair da cama para ir à casa de banho.
Óbvio que caíu, óbvio que ficou no chão do quarto sem que ninguém se apercebesse...
Arrancou, na queda tudo o que a si tinha ligado, perigando com isso os resultados da cirurgia.
Bateu com a cabeça não se sabe onde...mas pasme-se...a reacção dela face ao ocorrido  (que denotou falta de cuidado e profissionalismo por parte de quem assegurou o turno da noite), foi pedir muita desculpa pelo incómodo causado!!....

Com pessoas deste "calibre", acho que na vida tudo estaria simplificado!...
Fruto de uma outra época, de uma outra educação, de mais deveres do que direitos, de mais dificuldades e menos abundância, de mais disponibilidade e menos exigência, de mais "servir" do que "ser servido"??!!...

Ou simplesmente a formação interior e a postura de uma mulher SIMPLES??!!...

Anamar

sexta-feira, 8 de abril de 2011

"MEU DEUS......SER CRIANÇA OUTRA VEZ!!!!....."

 SEM OUTROS COMENTÁRIOS....
ENTERNECI-ME POR DEMAIS!

DEIXEM-ME PÔR CÁ FORA A CRIANÇA QUE AINDA SOU....



Anamar

quinta-feira, 7 de abril de 2011

O "ALTER-EGO"




Revi ontem um clássico da sétima arte: "Instinto fatal", com Michael Douglas e Sharon Stone.

Qual é o homem que não lembra o "célebre" cruzar de pernas da bela Sharon, o que aliás renomou o filme, não tanto pelo conteúdo?!...
"Tá bem"...aceito! A trama também não está mal urdida!...
No fundo trata-se de  um thriller "requintado". Mas não foi essa a razão por que me tocou a campainha do sótão...

Sharon enquadra uma figura polémica, enigmática, com uma personalidade dúbia que tem o poder de baralhar, trapacear, pôr a cabeça à roda...
Ela é e não é...ela parece, mas talvez não seja, ela é um dois em um, encarnando um "alter-ego", que é a pedra de toque no filme, e prendendo os espectadores até ao fim, para que descodifiquem (se forem capazes), quem matou quem, e porquê...

Qual "Belle de Jour" - Catherine - Sharon - alicia os amantes, não se permite ter para com eles nenhum outro sentimento que não seja o físico e o carnal, e com uma frieza e um distanciamento premeditados, numa patologia obsessiva-compulsiva e quase delirante, elimina-os em crimes hediondos...
Ou talvez não...
essa, a duplicidade explorada no filme, no jogo de esconde-esconde feito pelo realizador sobre os espectadores.

Foi Catherine quem cometeu os crimes, foi Roxy, foi Lisa??... Quem, afinal??

É o de menos!!...

Pensei de imediato numa outra película que vi há tempos atrás, nos écrans da capital, com Jodie Foster como protagonista, a qual mereceu a minha análise que deixei registada num post escrito então. Chamava-se ele "A estranha em mim"
Jodie Foster representava sumariamente a figura de uma radialista, com uma vida de inteira normalidade, a qual é sujeita a uma situação traumatizante extrema, que lhe desvia a existência de cento e oitenta graus.
Absoluta e definitivamente marcada, assume posturas em consequência, que ela própria não reconhece.

Quando lhe é perguntado "como se sai de uma situação tão traumatizante", quanto a por si experienciada, ela responde amargamente : "Não se sai!..."
E quando lhe perguntam como é viver depois de tudo, ela  responde que não se vive..."sobrevive-se"!!...

As abordagens que fiz, têm em comum, o desencadear por razões patológicas ou situações de traumatismo físico ou psicológico, de um outro "eu" que provavelmente existirá dentro de cada um de nós, devidamente acorrentado , espartilhado, enquadrado por fronteiras ou comportas.
Uma vez desencadeada a manifestação desse "alter-ego", o indivíduo em causa poderá assumir comportamentos, atitudes, personalidades, posturas, até provavelmente irreversíveis e irreconhecíveis...

Talvez seja por algo deste tipo, que a sabedoria popular diz: "Ninguém diga: desta água não beberei!"...

Eu defendo, e já o disse em círculos próximos, que qualquer pessoa será capaz de qualquer coisa ; tudo depende das circunstâncias, dos antecedentes, do contexto, da vivência por que passou, da "tempestade" a que foi sujeita, em suma, do traumatismo que experimentou ou que lhe infligiram!

Daí em diante esse indivíduo, afinal esse "outro" indivíduo, terá respostas sociais, familiares, profissionais, ininteligíveis ou inesperadas até, numa duplicidade personalística, por todo o conflito interior que o afrontou.
A sua vida não é mais vida, é sobrevida;
Esse indivíduo não se permite restabelecer conexões de emoções ou afectos, por medos, necessidade de defesa ou sobrevivência!
Penso que essa "dupla personalidade" adquirida ou mesmo a assumpção de uma "outra" personalidade, uma vez estabelecida, não serão princípios morais (?), sociais ou outros, que a conseguirão impedir de se manifestar.

Não sou psicóloga, não tenho formação nessa área.
Falo por sensações/percepções. Falo por análise. Falo por conclusão.
Provavelmente sou inconsequente e assustadoramente atrevida!...

Desafio-vos para que opinem....
Se estiver errada, que mo digam. Ficaria grata!!...

Anamar

terça-feira, 5 de abril de 2011

"DAVA-ME TANTO JEITO..."



DAVA-ME TANTO JEITO SER CRIANÇA OUTRA VEZ….

RODOPIAR PELOS CAMPOS, SOLTA COMO OS ANIMAIS DA SAVANA…

DAVA-ME TANTO JEITO VER AQUELE RUBRO DAS ACÁCIAS, QUE SÓ ÁFRICA CONSEGUE PARIR…AQUELA TERRA VERMELHO DE FOGO, OU ABRAÇAR O EMBONDEIRO, PENSANDO QUE CONSEGUIA ENVOLVER O SEU TRONCO…

SENTIR O CHEIRO DA TERRA MOLHADA, DEPOIS DAQUELE DILÚVIO TROPICAL, E DEIXAR QUE A ÁGUA ESCORRESSE PELO MEU CORPO, OLHANDO O CÉU, SABENDO QUE O SOL ME ABRAÇARIA A SEGUIR, E ME SECARIA PELA MATA, “PICADA” FORA…

TER O MEU PAI, TER O PRIMEIRO AMOR E ACREDITAR NELE COMO SE ELE FOSSE PARA TODA A VIDA…

E  ESPERAR CADA MINUTO QUE PASSAVA, ATÉ QUE ELE CHEGASSE, COM O CORAÇÃO A ACELERAR, SAIA RODADA DE ADOLESCENTE, E AS PRIMEIRAS “TRANSGRESSÕES”AFECTIVAS…

DAVA-ME JEITO ACREDITAR QUE O MUNDO IRIA MUDAR, COMIGO OU JÁ DEPOIS DE MIM, NÃO INTERESSAVA, MAS MUDAR, E QUE OS MEUS FILHOS E NETOS, QUE FICARÃO QUANDO EU PARTIR, PODERÃO TER DIAS MAIS AZUIS.

ACREDITAR QUE AS PESSOAS ACREDITAM, QUE HÁ FUTURO PARA TODOS…QUE JEITO QUE DAVA!...

TER OUTRA VEZ VINTE ANOS, PÔR AQUELA “CAPELINE” E OLHAR-ME NO ESPELHO, ACREDITANDO QUE SERIA ASSIM ATÉ AO FIM, ESSA SERIA A IMAGEM QUE O ESPELHO SEMPRE ME DEVOLVERIA…E NÃO!...FUI DEFRAUDADA!...

DAVA-ME TANTO JEITO PENSAR QUE AINDA EXISTE EMOÇÃO, AMOR, AFECTO, CUMPLICIDADE POR  AÍ, À MINHA ESPERA, E NÃO TER QUE PENSAR QUE, AO METER A CHAVE NA PORTA, ME ESPERA UMA CASA VAZIA, VAZIA, COMO HOJE JÁ ESPERA…MEU DEUS…COMO ME DAVA JEITO!!!...



Anamar

domingo, 3 de abril de 2011

"ESTA COISA QUE CHAMAM DE VIDA !..."


"Há-de vir um dia e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo"
 
(Adaptação de Ladainha dos Póstumos Natais -
David Mourão Ferreira)

O Norberto foi-se embora. Foi com as águas de Março, nem esperou que a Primavera, acabada de chegar, lhe mostrasse o ouro das mimosas, o branco das margaridas, o roxo das violetas e dos lírios, o amarelo das macelas em mistura com o fogo das papoilas dos campos...Logo o Norberto, que tinha um nariz "de cheirar", uns olhos "de ver", umas mãos "de sentir", que arrancavam àquela viola sons que só ele sabia arrancar.

Foi-se embora, mas eu acho que não fechou a porta, deixou-a entreaberta para não fazer barulho.
Foi pé ante-pé, sem fazer estrilho, a uma hora em que nos apanhou distraídos e o deixámos ir.
Também, ele não quereria incomodar ninguém!

Era assim o Norberto, uma muralha de aço, um HOMEM erguido do chão, enquanto deu, uma força da Natureza.
Imagino-o timoneiro de um navio, na eminência de naufrágio, à popa, a querer agarrar o mar de frente, fustigado por ele, mais e mais. Inabalável...na determinação, na força de coração, na fé da luta...
Apenas, as ondas daquele mar eram demasiado alterosas, o vento demasiado forte, a borrasca demasiado traiçoeira e num "golpe de mar" o Norberto foi espreitar como era o "lado de lá"...
"Estou curioso, sabe? Aquilo lá deve ser bom"... tinha-me dito em voz quase apagada, menos de quarenta e oito horas antes.

Tenho para mim que ele não foi zangado com o Mundo.
Ele não era pessoa de se zangar com as injustiças da vida (e teve muitas), e também não se zangaria com a maior, a mais gritante, a mais sacana que ela guardara para si...

Se calhar partiu ao som daquele CD que não conseguiu terminar ; se calhar veio um anjo (se é que há anjos), pegou-lhe na mão para o levar para uma qualquer encruzilhada de luz em que ele acreditava...
E ao longe ecoavam os acordes da sua viola, da sua voz, nos temas que realizariam a sua vida...naquele sonho sonhado!

Partiu sem reclamar...estará por certo melhor, mais em paz, menos cansado, sem aquela maldita máscara de oxigénio (sem a qual já não vivia), sem aquela maldita vista de um mundo indiferente cá fora, de uma Lisboa igual , que parecia zombar da sua própria prisão que o amarrava àquela cama de hospital...

O Norberto foi-se embora...
Mas tinha-me prometido aqui há tempos atrás, entre uma bica e meia dúzia de larachas, que se fosse, vinha cá contar-me como é que era...e ria...

Por isso, pelas madrugadas, vou estar atenta, porque numa qualquer delas, talvez naquelas em que a insónia me traz ao coração todas as mágoas de vida, tenho a certeza que vou ouvi-lo com as palavras de ânimo, de carinho e de fé, com que sempre tentou levantar-me do chão...e vou pedir-lhe desculpa por, apesar das "fileiras cerradas" que erguemos, a nossa força o não ter impedido de nos deixar!!...

""  Há-de vir um dia e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo"

(Adaptação de Ladainha dos Póstumos Natais -
David Mourão Ferreira)

(Homenagem póstuma e humilde a um ex-aluno, companheiro de jornada, Homem de corpo inteiro, alma sã....um grande AMIGO!)

Anamar

quarta-feira, 30 de março de 2011

A VIDA QUE "NUNCA" TEMOS !....


Hoje este post é e não é meu!

É meu porque o seu conteúdo foi por mim totalmente "adoptado" e subscrito.
Não é meu, porque não fui eu que o escrevi...

Por razões óbvias, não me foi possível solicitar à sua autora, autorização para colocar o seu magistral conteúdo no meu humilde espaço; mas porque o acho extremamente bem escrito, de uma lucidez, realismo, objectividade, clarividência a toda a prova...achei que tinha, de alguma forma, "obrigação" de partilhá-lo convosco!

Tenho a certeza que ela não objectaria à sua colocação...

As boas sementes dão boas flores e bons frutos ; nesta vida, há que reflectir mais e mais todos os dias...sempre!

À Dra. Carla Machado, onde estiver...os meus agradecimentos, de coração...os nossos agradecimentos, de coração! Bem-haja!


“A Vida Normal”, Carla Machado in PUBLICO, 24.08.2006

Doutorada em Psicologia pela Universidade do Minho


“Todos passamos a vida a desejar a vida que não temos.
Queixamo-nos do emprego, dos colegas que são chatos, do chefe que não nos dá valor, do muito que trabalhamos e do ordenado que é fraco.

Reclamamos do tempo, que chove e não se pode ir à praia, que não chove e faz mal à agricultura, do sol que é pouco ou demasiado, do suor, do frio e do vento, do calor que nunca mais se vai embora e do Verão que nunca mais chega.

A família cansa-nos, mas odiamos quando esta nos ignora; dizemos mal dos amigos sem os quais não sabemos passar; suspiramos pelo fim do serão em que as visitas se vão embora, mas despedimo-nos combinando um novo jantar. Estamos fartos dos filhos, mas passamos o tempo a falar deles e a mostrar as suas fotografias aos amigos. O barulho que fazem enlouquece-nos, mas o silêncio da sua ausência é insuportável. Queixamo-nos do marido ou da mulher, que não são como dantes, que nos irritam, que não nos surpreendem, mas suspiramos quando nos faltam e reclamamos quando fazem alguma coisa com a qual não contávamos.

Estamos no Algarve a suspirar pela frescura do Minho, no Minho damos por nós desejosos da brisa costeira; na cidade irrita-nos o artificialismo e em Trás-os-Montes formigamos com a ânsia de fugir à ruralidade.

E do país, todos nos queixamos até ao momento em que “lá fora” concluímos com um orgulho disfarçado que realmente “comer, comer bem, só mesmo em Portugal”.
De queixume em queixume, passamos pela vida muitas vezes sem deixar verdadeiramente que a vida nos atravesse. E só quando somos roubados ao quotidiano que tanto maldissemos, damos conta do tempo que perdemos, nos lamentos sobre o tempo que os outros nos fazem perder.

Há pouco mais de um mês, numa consulta que era suposto ser de rotina, foi-me diagnosticado um tumor. Felizmente benigno, como soube após 24 horas de espera.
E, tal como seria de prever, naquele momento inicial em que o espectro de algo mais grave ainda não tinha sido afastado, o meu pensamento imediato foi: “Mas afinal porque é que eu estou aqui, afundada em Braga a trabalhar, em vez de ter já há muito tempo fugido para Bora-Bora?”
Passado contudo tal instante, e nas 23 horas que se seguiram, foi da vida normal que tive saudades antecipadas.

A vida normal: trabalhar, ir ao cinema, abraçar quem amo, rir-me das pequenas parvoíces do quotidiano, ver a minha filha a dormir e sentir o seu cheiro.
A vida normal está aqui mesmo ao lado. E aposto que Bora-Bora tem imensos mosquitos.”



O texto do jornal Público que envio em anexo foi escrito em Agosto de 2006 pela Prof. Dra. Carla Machado, colega da Escola de Psicologia da Universidade do Minho. 

Com o decorrer do tempo o tumor que ela refere no texto, veio infelizmente a revelar-se maligno e, após uma luta de quase 5 anos, a Prof. Carla faleceu anteontem (Fevereiro 2011) tendo sido hoje a cerimónia fúnebre.

Sendo ela, sem dúvida alguma, desde há alguns anos, a referência na área, tenho um orgulho enorme em ter sido seu orientando aquando do meu mestrado, tendo sido ela a incutir-me o
gosto e a motivar-me a seguir em termos de investigação e intervenção, a área da psicologia da justiça.

Hoje recordaram-me esta sua crónica. 

Permitam-me que como homenagem, difunda mais uma vez este seu texto. Sem queixume, sermos exigentes connosco e com os outros e sermos sempre competentes e cada vez melhores. 
Ela era assim.

Ricardo Barroso


Anamar 



"O TERCEIRO DEGRAU"


Das minhas "pestes", o único que ainda não teve direito a lugar "de honra" neste meu abordar de pingos de amor, foi o Frederico.
O Frederico, que a brincar a brincar está quase com quatro anos... o Frederico que é o mais traquina, o mais descarado, o mais simpático e o mais carinhoso dos três...
Ele dá abracinhos, ele distribui beijinhos, ele encosta a cabecinha, ele derrete todo, qual um "mon chéri" em época de calor...
Ainda não se percebe claramente o que ele diz, é um pouco trapalhão mesmo, mas tem "tiradas" absolutamente espantosas!

No domingo passado, a minha tarde foi com o Frederico, ocupados que estavam os irmãos em tarefas escolares já a sério, havia que retirar de casa o "Quico" ( como se auto-denomina ), pois ligado permanentemente a "Duracell", não pára nem dá descanso a ninguém!

Fomos, eu, a minha mãe, a madrinha que é a minha filha mais nova e ele próprio, até Belas, ao golfe.
Aproveitei e levei-lhe dois livrinhos do antigamente, da mãe ou da tia (já não lembro), com as letras.
Devo dizer que o Quico conhece claramente, sem ninguém lhe ter ensinado, as maiúsculas todas e os números até dez.
Juntei portanto as gerações extremas, a minha mãe com noventa e o Quico com três...

Esteve impecável, sempre ao colo da sua "Bi" ( a forma carinhosa com que os três tratam a bisavó ), o que a deixou obviamente desvanecida.
Para ela, foi um recuar ao tempo das netas, às histórias que lhes contava e mais as que inventou na hora (porque a minha mãe sempre teve o poder que eu considero absolutamente "milagroso" e invejável, de entreter crianças!
Infelizmente não lhe herdei o dom...)
O Frederico olhava-a seriamente, com os seus dois livros sempre debaixo do braço, a "beber" as suas palavras.
Faziam-lhe um pouco "de espécie" as rugas da cara da minha mãe, bem pregueadinha, e apalpava-as como se de algo estranho se tratasse. Perguntou-lhe pelo Gaspar (ainda se lembrava...), distribuiu-lhe abracinhos, mimoseou-a com beijinhos...

Come imenso, de tudo, sem esquisitices, porque "quer ser grande". O Quico é pequenito e parece uma vassourinha com a bata do colégio vestida...
É uma criança feliz com o Mundo, vê-se no seu rostinho extrovertido, iluminado por um sorriso permanente...
Que Aquele não lhe seja muito "carrasco", é o que quereria para ele, e que ele saiba manter pela vida fora, a ternura, o carinho a simpatia e a doçura que ora distribui...

Eu sou altamente suspeita, óbvio, mas a minha "escadinha", da qual o Quico é o seu terceiro degrau, é absolutamente FABULOSA!!!...

Anamar

domingo, 27 de março de 2011

"CONTROLE A SUA DECEPÇÃO COM O MEU POST!"


Olá
O post que eu escrevera para hoje não era este.
Um dia conto-vos por que o não coloquei "no ar".
Hoje escolhi meia dúzia de "patacoadas", como diria o meu pai, para talvez se rirem um pouco.

Dei por mim um destes dias a vociferar: "Oh meu Deus, oh meu Deus, oh meu Deus! Logo eu!..."
Eu que saí da primária sem dar um só erro de ortografia, eu que sou do tempo em que havia os erros e os quartos de erro (pela pontuação e acentuação), em que, logicamente quatro quartos já somavam um erro :)....e em que a partir dos três, era certinho e direitinho que adquiríamos "direito" a orelhas de burro ou reguadas!...

A minha professora da primária, em colégio particular que frequentei ( mais tarde minha madrinha do Crisma na Igreja do Carmo em Évora ), exigente que só ela, era a figura típica da perceptora inglesa do nosso imaginário.
Magra, alta, bem solene, com o cabelo apanhado atrás em carrapito, não era de risos, nem de contemporizações...
Solteirona, já com sessenta na altura, penso, era uma figura austera, e até o carrapito que poderia conferir-lhe alguma bonomia, o não fazia, porque era um carrapito "fino", estão a ver? E não aqueles carrapitos "bimbos" do interior do nosso país.

Então, reflectia eu, como hoje em dia se me colocam questões de escrita e de acertos da mesma??!!...
É muito frequente ir ao dicionário, à Wikipédia, à correcção automática do computador...é muito frequente escrever a palavra das maneiras possíveis, olhá-la da esquerda, olhá-la da direita, de cima, de baixo, a ver o que ela me "diz"...
É muito vulgar, como a minha professora me ensinou, ir à etimologia da palavra, à sua raíz, e verificar nos derivados, a manutenção de certas consoantes, coisa que a gente de hoje nem sabe o que é...

E mesmo assim, os g e os j, os z e os s, a "precariedade" ou a "precaridade" (já vi escrito das duas formas...), fazem-me "cócegas" na cabeça...
E já não falo de acordos ortográficos e quejandos.
A esses, acho que sempre serei resistente, passando então, a legitimar mesmo os meus próprios erros...

Eu acho que isto é, como a minha mãe diz, sinal dos tempos..."a vida tudo nos dá e tudo nos leva"...
Até esta minha qualidade de absoluta correcção na escrita, começa a claudicar...BOLAS!!!

Mas depois, desculpem lá, também nos baralham as ideias : "prol" e "prole"...basta que pense um pouco e sei lindamente a diferença, quando devo empregar um, ou o outro vocábulo...
A minha "reclamação" prende-se com o facto de ver nas portas das farmácias, aquelas caixinhas de "emergência médica" anunciando os "CONTROL", quando cá para mim, a lógica seria anunciarem os "CONTROLE", já que com eles, os mais desprevenidos e menos avisados, pretendem controlar alguma "surpresa" que os possa apanhar na curva!!....eheheh

E pronto, desculpem estes "faits divers"; afinal hoje é um domingo primaveril, meio "xumbrega", com muito pouca coisa para contar...

Anamar

sábado, 26 de março de 2011

"IRREMEDIÁVEL PAIXÃO"


O Alentejo estava a dormir espreguiçado na planície...
Nem percebeu que eu passava.

Ainda só tinham acordado, as giestas, as estevas e as bolinhas de ouro das mimosas, à beira da estrada; essas, há muito haviam tirado as ramelas dos olhos e encaravam um sol fraco e envergonhado, por detrás das nuvens.
Eu pedira céu azul e limpo...não se pode ter tudo!...

Também nos prados, ora bem verdes, fazendo jus às chuvas impiedosas deste Inverno que não nos deixa saudades, os novelos brancos das ovelhas em rebanhos, pareciam floquinhos de neve acabados de cair.
Alguns cavalos garbosos, provocadores e ociosos, exibiam as crinas de liberdade.
os campos verdes até onde os olhos se perdiam, "sangravam" de onde em onde pelo vermelho profuso das papoilas...
Vêem-se já poucas papoilas por aí, mas aqui, na minha Terra, ainda há verdadeiros redutos vermelhos.

E depois há os sinais tristes destes tempos: os montes degradados e abandonados na planície, mostram a desertificação, a solidão, o sinal de que o Alentejo começa a não ser "casa", senão para os velhos que ficaram.
Exibem janelas e portas esventradas, mato a crescer à volta, mas chaminés hercúleas, ainda desafiadoras dos céus...

Os pássaros, esses, mesmo tendo asas, não abandonaram o Alentejo.
Desde as andorinhas, em voos rasantes bem junto ao solo, rodopiando, as rapinas em espreita de caça, planando, as garças boieiras depenicando no gado, às cegonhas, altaneiras inquilinas sobretudo de postes de alta tensão...esses continuam fielmente presos à paisagem, fielmente presos aos espaços que não têm limites, porque liberdade combina com pássaro e pássaro sempre representa liberdade...

Évora recepciona-me pela enésima vez, pela vida toda, sempre "quente", sempre igual e sempre diferente. Sempre é berço de repouso...isso eu sei-o, ainda antes de franquear as muralhas.
As cores são aquelas, o silêncio é aquele, a paz é aquela...
O rosto é o meu, de menina-mulher, que lá me fiz...os sonhos, também;
Évora sempre floresce cada ano, das minhas raízes que ficaram fundo no solo. Mais tarde plantei-lhe outras raízes...essas também lá estão, mas as únicas flores que conseguem parir, são as de glicínia roxa, lágrimas roxas pendentes e cheirosas...


Calcorreei tudo, tudo que preciso ver, porque Évora também me fornece o oxigénio para respirar melhor, para viver melhor...
Fui pela milésima vez aos "meus sítios", numa romagem de saudade, numa doce lembrança, num deixar-me recuar e ir, e ir e ir, até onde os sonhos me foram levando, numa masturbação de alma e coração que não termina nunca.

Já lá não está a "minha chaminé das cegonhas"...o tempo destruiu-a, como nos faz a nós...e com ela, foram também as cegonhas...
Mas isso que importa, se eu também não estou mais àquela janela em frente, a ver-lhes cada movimento, cada voo majestoso, todas as Primaveras?!...
Se eu não sou mais menina, se o meu pai já não existe mais, se aquela casa está sepulcralmente fechada e degradada?!...
Nem já existem as árvores de flores, intensas no cheiro e nos mosquitos, que me entravam pelas sacadas adentro!!...
Também aí o meu espaço ficou perdido na curva lá atrás!

A Universidade, o "meu liceu" de então, imponente, sólida, grandiosa, essa, arrosta com os tempos, as tempestades, os acontecimentos.
Vasculhei tudo;
A "Sala dos Actos" aberta, mostrava uma outra vez, a beleza da azulejaria antiga portuguesa, a cátedra do reitor e outros representantes académicos, ao tempo...e lá estava eu, tímida, muito tímida, sem saber por onde ia, mal ouvindo o meu nome a ser chamado, no meio de palmas, para receber alguns prémios de então, com a minha mãe na assistência a escorrer lágrimas de orgulho!!!...

Também lá estava a sala onde fiz o meu exame de admissão ao liceu, no fim da quarta classe, lembram-se? com as tranças no cabelo da criança que era...
A fonte em pedra, à roda da qual, que nem uma perdida, me esfalfava a brincar "ao agarra", com a Mané...
O sino que assinalava o começo e o fim das aulas, ainda ecoa naqueles claustros, embora talvez o seja apenas no meu coração...e eu estou a baralhar tudo!!...
Um pátio interior, na altura anexo ao Laboratório de Química...e agora, ao que parece, já nem Química lá há!
E o bar dos chupas-chupas de frutas, a vinte e cinco tostões, também já mudou de sítio, e os chupas também já não existem certamente mais!...
Os alunos universitários não comem chupas, óbvio!!...

A Praça do Giraldo, o Café Arcada...
Que envolvente e gratificante é, estar ali sentada ao sol, a fumar um cigarro, frente a uma chávena já vazia, só a ver o tempo a correr lento, como o tempo corre no Alentejo...rumo à eternidade!!

O meu périplo terminou, como não poderia deixar de ser, no jardim de D.Manuel.

Como quem visita um túmulo, um local de interioridade e intimismo, estive junto ao busto de Florbela Espanca, colocado nesse jardim.

Fui "visitar" a mulher da "Charneca em Flor", essa mulher inteira, que para mim é um talismã, um mito incontornável, um ícone, porque fala a minha e também a linguagem do Alentejo, porque traduz o meu e o sentir do Alentejo, porque, como sobejamente já aqui disse, interpreta fielmente, em simultâneo, a fragilidade e a força titânica de uma alma feminina!...

Fui, como que agradecer-lhe o ter existido, o ter sido como foi, o ter tido a coragem, a determinação e a frontalidade, apanágios da sua vida...o ter sido, afinal, uma mulher daquela Terra!!...

Anamar

quarta-feira, 23 de março de 2011

"ERAM OUTROS TEMPOS !..."

Hoje resolvi começar a reler os meus escritos.
Não sei se vos disse, mas tenho imprimido todos os textos do meu cantinho, desde o início, e com eles formado livros, em suporte de papel, óbvio.
Eu sou muito à antiga em certas coisas e confio, mas confio muito, nos livrinhos na estante, propiciando uma maior facilidade de leitura.
Além de que eles serão o meu espólio mais precioso (não pelo conteúdo que é irrelevante, mas pela autenticidade, transparência, pelo desnudar sem censura ou pré-intenção, daquilo que realmente sou, da pessoa que eu vou sendo e que um dia terei sido), a deixar aos meus netos.

Não sei se algum deles terá a pachorra de os ler, quem sabe em adultos, quando eu já for uma imagem pálida nas suas cabeças, se algum, dizia, terá a curiosidade de saber quem era e como era aquela avó (ainda por cima demasiado ausente nas suas vidas, como já tenho confessado).

Comecei a relê-los (já vou em sete volumes), por saudosismo, para auto-análise, até para tentar perceber a minha evolução ou involução ao longo destes anos.

Que o meu discurso tem sempre uma tónica muito próxima, isso eu sei.
Que se pauta por uma dolência e cores escurecidas...também!
Que, se calhar desmotiva a leitura por se revelar verdadeiramente chato...é possível!
Não é isso que me preocupa primordialmente.

Ao aceitar "assomar" quase diariamente a este varandim, sem décor, maquilhagem ou fantasia, aceitei um risco inerente...talvez o afastamento dos leitores.
Apenas, este meu "debruçar" da varanda, é o "meu" debruçar, e tem que ser livre, verdadeiro, autêntico, sem condicionalismos ou pressões de "parecer bem".
Por isso continuo e continuarei, de uma forma independente a vir aqui, enquanto tiver fôlego, necessidade, gosto por fazê-lo, tendo ou não "audiências", gostando ou não quem me lê...

Comecei como é lógico, pelo primeiro volume, onde encetava os primeiros passos nestas andanças, onde em cada post quase sempre havia um "feed-back" sobre o mesmo.
Na altura havia alguém que me lia e hoje não me lê mais, seguramente.
Alguém que a vida se encarregou de afastar de mim, alguém que a estrada levou para outros horizontes, de uma forma injusta e magoada...

Reflectia eu há tempos, por aqui, como a nossa existência cruza e descruza com outras; como o tempo, carcereiro implacável, mais afasta do que aproxima quem já se quis muito bem, mercê de tantos acontecimentos, mercê de sofrimento, dificuldade, dor.
Como ele molda sem dó nem piedade os corações, como ele semeia injustamente mágoas inultrapassáveis, como ele fustiga os sentimentos...

A "perda da inocência" que foi mote de um dos meus primeiros posts, acaba mesmo por instalar-se; o cair do pano no palco do nosso dia a dia, acaba por deixar inevitavelmente, os figurantes em cena, já sem espectadores na sala, sós consigo próprios!

Esse alguém, que certamente hoje também já a perdeu infelizmente, exortava-me então, a continuar a acreditar, a acreditar em mim, acreditar num futuro, acreditar num presente, porque, segundo ele, o acreditar está no melhor sítio do ser humano: na sua cabeça!

Pois meu amigo (era assim que me tratava na altura), mesmo não me lendo...no sopro do vento, na nuvem que passa, no sussurro de uma borboleta, ou até nas asas da "minha gaivota", que seja eu a poder dizer-lhe agora, que lembre o que me disse na altura, e que continue com a tenacidade, a determinação que tem tido na vida, a coragem, a fé e ainda a esperança com que, apesar dos pesares enfrenta as "rasteiras" que a mesma injustamente lhe preparou, encarando cada dia que se inicia na sua vida, e que mantenha guardados intocáveis dentro de si, na sua cabeça, os valores de persuasão com que há anos atrás me procurava animar, em dias de céu cinzento...

Eram outros tempos!!!...

Anamar

terça-feira, 22 de março de 2011

"A NU ... "

Mais uma noite mal dormida.
Não sei se das dores na lombar ( terrível, hoje ), se da subida de temperatura que se fez bruscamente sentir, se da Primavera que começou...Sei lá!
Como tal, um intervalo a meio do "jogo", que é como quem diz, nada como duas horinhas para pensar, repensar e nada concluir, ou pelo menos nada aproveitável.

Um dos flashes que me passaram pela cabeça, prendeu-se com o meu post "NÃO VOU POR AÍ!"...
Entretanto meteram-se-me os "SONHOS" de permeio e esta noite...os pesadelos!!! rsrsrs

Há dois posts atrás falava-vos então de Nelson Mandela, da sua personalidade, do homem, do cidadão e do político; falava-vos das qualidades a ele inerentes, natas ou trabalhadas, não interessa, invulgares no ser humano, mais ainda se submetido injustamente ao inferno, vilipendiado, por discriminação gratuita de cor e raça, que lhe sonegou da vida, já por si sempre curta, trinta anos...
Esses, ninguém poderá restituir-lhos, desses, ninguém poderá ressarci-lo, nem das consequências que os mesmos tiveram a todos os níveis, desde a desestruturação familiar, à complexidade de sentimentos, dores, sofrimentos e doenças, que o terão assaltado em cativeiro.
Pois ainda assim, como vos dizia e não me vou repetir, há uma qualidade entre todas, que considero inestimável em Mandela e que me causa uma inveja imensa, no bom sentido, claro: a sua perseverança e determinação no atingir dos seus objectivos, no perseguir dos seus ideais, no poder do seu acreditar.
Disso também são "fabricados" os grandes Homens!

Terminei o post dizendo que de alguma forma me revejo nessa "independência" descomprometida da individualidade em apreço, no não seguidismo, a qualquer preço, do instituído, se nele não acreditamos, no anti convencionalismo e subserviência que baixa a cabeça e rasteja a poderes, se conveniente...
Mandela nunca teve preço, isso é reconhecível!!

De alguma forma eu também exibo o meu "nariz empinado" para com a vida, bato o meu pé àquilo que não "assumo", aceito situações de marginalidade se acreditar nelas...nem sempre ando na corrente, nem sempre faço parte do "rebanho"...

Mas reconheço em mim uma imperfeição tremenda, a propósito.
A minha determinação carece de verdadeira aposta, a minha perseverança é pálida, a minha vontade periclitante.
É uma falha personalística imensamente grave, eu acho.
É ela que me leva a nunca concretizar na minha vida, de um modo geral, as apostas em que me envolvo, as iniciativas que tomo, os projectos que se pintam de ouro no início, e se desvanecem como nuvens no firmamento.
E sofro imenso com isso, porque me penalizo e se calhar não deveria, porque também sei que não conseguirei alterar o "stato quo", na medida em que, sendo algo intrínseco, dificilmente é mutável nesta altura do "campeonato".
Provavelmente sou demasiado radical e severa comigo mesma, o que aumenta o meu grau de insatisfação e infelicidade, sendo que, já bastaria a auto-análise e a "mea culpa" que faço todos os dias...
Costuma dizer-se que "o que não tem remédio, remediado está", será um pouco isso no meu caso, embora eu continue "estrebuchando" comigo mesma.
Só não sei o que fazer, como fazer!!!

Noutro dia, falando com a minha filha mais nova, que é exactamente o oposto de mim nesta vertente ( ela experimenta tudo, adere às mais variadas iniciativas, divide-se, desdobra-se, alonga os dias para lá do razoável, e por isso não se entedia, conhece montes de pessoas, as mais diversas...e ainda por cima acha tudo o máximo...), dizia-me ela: "Eu tenho que voltar cá em mais não sei quantas vidas...O que eu tenho para fazer...sério, mãe, o tempo de que disponho para viver, não vai dar nem p'ra metade!!!" - e dizia-me isto com um entusiasmo convicto!
Se calhar o entusiasmo dos 33 anos, com uma experiência de vida e um olhar sobre o mundo, que talvez eu ainda hoje não tenha...

Há tempos atrás, na altura em que a minha vida profissional virou, também me dizia a mais velha: "Já viste, agora vais poder fazer tantas coisas giras que até agora não tinhas tempo p'ra fazer!..."

E eu pergunto-me: "Que raio de avantesma sou eu??!!... Onde estão as coisas giras?? E se as há e haverá por certo, por que não as acho, por que não me mexo para as achar, ou por que quando as encontro, a sua "aura" é fugidia e eclipsa-se rápido??!!"...

Às vezes, obsessivamente, esgravato até alcançar qualquer desiderato que me assalta, de uma forma compulsiva, que me tira frequentemente o sono, me traz o coração à boca, leveza à alma, sorriso aos lábios...parecendo que, aquilo sim, é uma saída para mim...
Foi assim com a construção das casas, com a decoração das mesmas, já foi assim com uma peça de roupa, um bibelot ou um móvel que me espreitava numa vitrina.
Uma vez atingido, uma vez alcançado ou possuído, é desvalorizado no imediato, torna-se efémero, e de novo insatisfatório.

Agora até lembrei aquelas imagens de alguns predadores que caçam pelo gozo de caçar, brincam com a presa, largam, pegam, judiam com a pobre, antes do golpe de misericórdia...
Depois...perdeu o interesse..."game is over"
É maquiavelismo??!!... Não sei! "É masoquismo??!!... Também não!
Sou obsessiva-compulsiva??!!...Vá-se lá saber! Também, não gosto de rotular nada nem ninguém!!

Meu Deus...onde isto já vai!...
Daqui a pouco estou a auto-internar-me numa clínica de doidos!

Comecei na insónia nocturna...as conversas vão e vão e vão...
Desculpem, isto foi somente pensar alto, sem lápis azul, sem sequer auto-censura...a nu, perante vocês!...

Anamar