sexta-feira, 28 de setembro de 2012

" O GATO E O RATO "



Há tempo para viver, tempo para morrer, tempo para lembrar, tempo para esquecer, tempo para durar e também para acabar, para chorar e também para rir ...

Creio que a Vida tem "timings" que não se explicam, e o mestre é sempre o Tempo !

Ao sabor dele nascemos, crescemos e morremos.  Com ele, construímos e destruímos as construções de Lego, que são a nossa existência.
Tem um transcurso ilógico, ou com uma lógica que quase sempre nos escapa, ou que talvez nem devêssemos ou pudéssemos jamais apreender, embora pensemos que sim.
As suas determinações são sentenças proferidas diariamente, contra as quais pouco podemos fazer, e que independem dos nossos desejos, vontades ou sonhos.
E surpreende-nos.
Sempre nos surpreende, positiva ou negativamente, de forma nunca controlável, apesar de nos questionarmos permanentemente, e permanentemente nos pormos em causa, em todas as circunstâncias.

Como um vento de tempestade, quantas vezes varre, trucida, atropela, vá-se lá saber porquê, este ou aquele rumo que imprimíramos ao nosso percurso ( achando-o lógico, favorável, importante ),  com um indiferentismo aterrador !
O  tempo  não  mede  consequências,  não  explica,  não  se  compadece !...
É de uma imprevisibilidade que nos deixa continuamente à deriva, baloiçando-nos nas ondas, para cá e para lá, sendo tão possível chegar à costa, como morrer por cansaço, em alto mar.
Confunde-nos o tempo todo, rouba-nos todas as convicções ou certezas.  Joga connosco diariamente, com cartas viciadas, um jogo desigual, perante as quais, somos incapazes de reagir ...

Com uma ironia e um sarcasmo desafiadores, brinca connosco sadicamente, por pura diversão, como o gato joga com o rato, na agonia final.
Sacode, empurra, puxa, ignora ... para, num subtil movimento do moribundo, lhe pôr de novo a pata em cima, e lhe mostrar quão à  mercê da sua vontade, está a dele, totalmente impotente.
Resta-lhe abandonar-se e deixar-se morrer, o mais rápido possível.

Essa tortura, o tempo usa maquiavelicamente connosco,  todos os dias, e parece deleitar-se com o nosso estertor, o nosso esbracejar desesperado, a nossa incapacidade de boneco manipulado .
E também como o gato insensível, mostra o seu poder de predador sobre as presas indefesas, que somos todos nós, reféns da sua vontade e dos seus desígnios ...
Desarma-nos com "tiradas" comuns aos doidos, aos alienados, aos inimputáveis ... gozando com  a pessoa  que nós somos ;  cria-nos expectativas, alimenta-as, engorda-as, e a seguir, com um "porradão" bem forte na cabeça e no coração, deita-nos irrecuperavelmente por terra ... E ri ... ri com aquele riso escarninho, devasso, gozador, que parece saborear, típico dos que estão por cima ...

E de repente,  há um dia em que sem imaginarmos ou sabermos porquê, o que era, não é mais, o que sentíamos, deixámos de sentir, o que sonháramos, deixou de ser sonho ... e tudo volta ao antes do ser, ao antes do sentir, ao antes do sonhar, como se se tivesse fechado com o segundo parêntesis, uma frase escrita entre eles.
E perguntamo-nos, como foi que isso aconteceu ?

Bom, eu acho que simplesmente o tempo dobrou uma esquina ... tão só !
Mudou a direcção ou o trajecto desenhado, "fintou" o GPS ... como os meninos safados, fez a pirraça de nos confundir todos, e de nos deixar à nora, sem percebermos de facto, como de um dia para o outro, como num "clique", como numa imagem instantaneamente "flashada", se escreveu o último capítulo de um livro !...

E percebemos uma outra vez, que não somos mais que o ratinho impotente e agonizante, largado entre as patas do gato, que o olha de cima, com uma indiferença absoluta, e que talvez nem o coma ... basta-lhe já que o destrua !!!...

Anamar

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