quarta-feira, 19 de setembro de 2012

REBECA - a " OUTRA "



A maior parte das mulheres tem uma Rebeca nas suas vidas !...

Uma Rebeca morta, como a tão bem retratada na obra de Daphne du Maurier,  ( passada ao cinema por Hitchcock na sua primeira realizção na sétima arte  - 1940 ),  ou uma Rebeca viva, que essa, na verdade vira uma "assombração" de carne e osso, contra a qual atrever-me-ia a afirmar, ser ainda mais difícil lutar.

A Rebeca morta e enterrada, tem a força que as figuras míticas encerram .  Seres cujas armas não são as que detemos, terrenas ;  são seres que pelo facto de não existirem mais, adquiriram uma auréola e um estatuto mágicos e misteriosos, que mexem com áreas nossas, os humanos, muito mais difíceis de controlar ... o imaginário e o psíquico.
O psicológico foge-nos ao controle, porque não é racionável, e o ser humano sucumbe facilmente ao seu domínio.

É com essa força do que não é racional, lógico, palpável, que alguém que já foi, continua a imperar, a dominar, a condicionar, e a infernizar a vida dos que por aqui estão.
Por isso, essa "outra", consegue impor-se, intrometer-se, e ter um ascendente destrutivo de permeio a um casal.

Conhecemos casos desses, em que a "falecida" não faleceu na realidade ;
aliás quem cá está, continua a partilhá-la, a ser acorrentado por ela, e a fazê-la "reviver" constantemente.
Fazem-se referências subreptícias, a figura velada perambula pelos espaços e pelas pessoas, há comparações subtis, e até há muitas vezes, uma servidão e uma observância religiosa, dos hábitos, costumes, esquemas de vida  passados.
Ou então, em desespero de causa, a estratégia pode ser outra ;  eliminam-se rapidamente todas as referências a essa figura indesejável, tudo quanto materialmente se lhe associa, acreditando-se que com essa "limpeza", vai também a Rebeca perturbadora !...

Admito que hoje em dia, não é já muito comum, que qualquer substituta de Rebeca se deixe impressionar e comandar, sequer se submeter tanto, a ponto do  " fantasma da defunta", conseguir ter a força do retratado no romance.
Posso dizer que essa aí, face aos tempo actuais, é mesmo uma caricatura grosseira, já distante, felizmente.

Eu diria que o que nos perturba na realidade em que vivemos, o que incomoda, desestabiliza e mexe com a mulher de hoje, são as "Rebecas" vivas que andam por aí, às vezes a fazerem-se de mortas, é verdade,  mas com  armas  sempre  em  prontidão ... as  mais  variadas !...
Essas figuras que não passam de arremedos pardos, e que de tudo fazem para se recolorirem, pensam conseguir, de uma forma demoníaca, manipular com um grau de legitimidade que se atribuem, os cordelinhos dos bonecos, com que ainda sadicamente pensam  brincar. ...

Pura ilusão !...
O "cenário" nestas situações, não é de romance ;  é aqui, no palco real, onde se jogam vidas também reais !
Só que elas desvalorizam ingenuamente, que a vida já não se faz nas penumbras de quartos escuros e ambientes de luz velada, de mansões fantasmagóricas, porque já não vivemos entre sombras, a ouvir passos do além, figuras perpassantes, fantasmas ridículos, diáfanos e assustadores.

Essas Rebecas, lembram-me grotescamente as crianças que se embrulham num lençol, onde fazem dois buracos para os olhos, e nos saltam ao caminho, na esquina de um corredor, dando um salto e soltando um gritinho, convictas de que nos pregaram um susto pavoroso, monumental, que nos poderá mesmo deixar em estado comatoso, irrecuperável ...
E nós compomos a cena, e para as deixarmos felizes, fingimos cair para o lado, deitamos a mão ao coração e fechamos os olhos ... e tudo acaba numa estrondosa gargalhada !...

Também há adultos que continuam infantilmente a mascarar-se, no dia a dia, com lençóis "aterradores", e que confiam piamente, na credibilidade da personagem que vão representando ...

Pobres Rebecas, essas ... sobretudo se tiverem nos esconsos dos corredores, Lilliths em vez de Evas, a esperá-las ...

E nos anos que vivemos, com a emancipação física, emocional e afectiva da mulher , a sua assumpção e gestão das duas entidades numa só ... já não assusta !
Lillith não voltaria seguramente a ser desterrada para o Mar Vermelho, nem preterida na mitologia hebraica ou na Bíblia dos cabalistas !...

Por isso, as Rebecas estão cada vez mais a remeterem-se às catacumbas, donde nunca deveriam ter saído ( porque o seu "reinado", na verdade, já foi ), donde se esbate o seu poder, que já não opera milagres ...
E, as assumidas Lilliths, conseguem apagar cada vez com maior facilidade, as rugas dos lençóis, e as marcas dos corpos das Evas, na vida dos seus homens, de que não abdicam facilmente !!!




Anamar

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