quinta-feira, 21 de julho de 2011

"A MONTANHA DAS NOSSAS VIDAS ! "


Tudo muito modorrento por aqui... ou melhor, muitas coisas acontecendo em simultâneo, não me dando margem para usufruir daquele sossego, daquela concentração que me leva à reflexão mais profunda, ao inundar-me de emoções, à auscultação dos meus "interiores".

Realmente há tempos que não assomo ao espelho da alma... e não o fazendo... pois... fico "ressequida" por dentro, desconfortável, incompleta, amputada... e nesse estado lastimável, claro que não escrevo!

Tenho a minha mãe em casa, em luta com os seus noventa anos cronológicos contra uma cabeça talvez de menos vinte, e uma "carcaça" que inexoravelmente não se compadece.

O quadro diário é gravoso, é progressivamente gravoso; as capacidades, as forças, a memória... e claro, aquela mobilidade, a encostarem às "boxes"...
Tudo normal, tudo esperável, tudo de acordo com o "figurino humano"...
Só que a minha mãe "não quer"!...
A minha mãe declarou guerra aberta à areia da "ampulheta", e instalou-se num quadro amargo de existência desesperançada, que só vendo!...

A biologia devia "compadecer-se" com o desajuste entre a mente e a falência orgânica. Acho que seria menos doloroso, para quem já deixa de ter uma resposta aceitável, do "invólucro" que carrega (dentro dos moldes a que se habituou), se pudesse "apatetar" de vez... se "deletasse" as memórias mais ou menos recentes.

O indivíduo sofreria muito menos por inconsciência, a revolta e a inaceitação do grotesco em que se tornou, deixariam de atormentá-lo, e iria adormecendo em paz!...
Dessa forma, também quem o rodeia e se angustia perante a impotência face à irreversibilidade da situação, sentir-se-ia menos amargurado, penalizado, culpabilizado...
Porque, escusamos de dizer... tendo embora a consciência tranquila de um dever minimamente cumprido, tendo em paz a alma e o coração por se ter tentado todo o viável para que se atenuassem os efeitos... para as causas não pudemos encontrar remédio... e isso sempre nos atormenta!

Olhava há pouco o pôr-do-sol e pensava como na vida se criam carapaças, apesar de tudo, para tudo o que nela se tem que ultrapassar.
Já passei por muitas situações em que tive que "vendar" o coração.
Já atravessei muitos desertos de afectos, de mágoas, de sofrimentos. Foi então preciso arranjar mecanismos para o fazer, sem que as sequelas me derrubassem!
Pensamos sempre que desta é que não seremos capazes... que aquela lá, é a montanha das "nossas vidas"... aquela que nos vai barrar definitivamente o caminho...
Mas não! O ser humano, por sobrevivência, transcende-se, supera-se, ultrapassa-se, surpreende-se até a si próprio.
E uma e outra vez, cortamos metas, passamos fronteiras, atravessamos tempestades... e espantosamente saímos, não direi incólumes (porque saímos sempre um pouco "de menos"), mas, pelo menos... vivos!
Às vezes... quase sempre... atordoados, quase sempre cambaleantes e entorpecidos... mas VIVOS!

Esses os mecanismos que tento treinar de dia para dia... porque todos os dias há uma nova "montanha" por ali à espera, e eu tenho que a contornar, tenho que lhe descobrir as veredas que me podem levar até ao cume... para de novo poder ver o sol nascer !!!...

Anamar

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