sábado, 9 de maio de 2020

" AQUI DA MINHA JANELA " - HISTÓRIA DE UM PESADELO - Dia 59




À beira de numericamente completar dois meses de uma reclusão que parece ter a eternidade por dimensão, repenso se continuarei ou não, a escrever diariamente estas histórias que chamei de "pesadelo".
E repenso, por razões de vária ordem : desde logo, porque o cansaço de toda esta anómala situação que vivemos, me retira a disposição, o entusiasmo, e até alguma da alegria inicial que sentia em mim, quando comecei a rabiscar os primeiros textos.

Depois, já aqui referi vezes sem conta ( e é sentido por todos ), a indefinição carrasca do tempo, com dias que se arrastam morbidamente iguais, sem amanhãs que nos ponham em pé com esperança e ânimo ... e em que cada vez mais, acordar e sair da cama por cada dia, se mostra uma verdadeira e penosa epopeia ... amalgama as emoções num sentimento único, de cansaço e quase indiferença já !
Cada vez mais, arregimentar forças, não se sabe de onde, encarar o novo recomeço com optimismo e alguma convicção, é uma tarefa hercúlea !
Cada vez mais, fazer de conta que ... é algo que me violenta. Eu não sou dada a positividades, se delas não estiver convicta, não sou dada a discursos delirantes se não me saírem espontâneos do peito ... não sou dada a ver copos cheios, quando os vejo bem vazios ... não sou dada a pragmatismos exacerbados, embora saiba que tudo seria mais fácil para mim, encarando a realidade com o distanciamento por eles permitido.

Sou, geneticamente, uma pessoa negativa, fraca, sem resiliência notória ... impreparada para grandes confrontos com o destino.
Lido mal com as contrariedades, tenho dificuldade adaptativa às situações e aos desafios, e sossobro com alguma facilidade, "desmontando-me" emocionalmente, sem apelo nem agravo ...

Por tudo isto, duas questões se digladiam entre os meus neurónios ainda aproveitáveis :

- por um lado, os meus relatos diários começam a entediar, por semelhantes, por doídos, por falta de diversidade das vivências descritas.
Porque na verdade, à semelhança dos dias confinados às quatro paredes desta casa, aquilo que hora após hora me domina, é este marasmo cansado da repetição "ad eternum", de um esquema que não é mais de vida, mas sim de sobrevivência. Não consigo já ter fôlego, iniciativa, vontade ou gosto para colorir os dias, onde o cinzento teimosamente predomina ...

- por outro lado, penso que falhei rotundamente o desiderato que talvez tenha sonhado alcançar - que os meus escritos, tivessem junto de todos os que me lêem, um papel pedagógico pelo exemplo, um papel de utilidade, ajuda e incentivo no ultrapassar de todo este sofrimento, e que fossem capazes de canalizar sempre, uma mensagem de esperança, de optimismo, de força, de luz e de fé em relação a um futuro que todos temos, afinal, o direito a voltar a viver ...

Falhei !
Falhei porque me desconheci. Falhei porque exorbitei nas minhas capacidades. Falhei porque fui ingénua. E, "dos fracos não reza a História" ... soi dizer-se .

E hoje dou por mim, chorona muitas vezes, aflita outras tantas, desesperançada mais ainda, confusa, e mais carente talvez do que todos vocês, de um colo, de uma coragem, de um amparo ... de um ombro e de uma mão que me erga, de uma luz que me clareie este caminho de profunda cerração, neste epílogo crepuscular da minha existência !...

Até amanhã ! Fiquem bem, por favor !

Anamar

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