quinta-feira, 2 de abril de 2020

" AQUI DA MINHA JANELA " - HISTÓRIA DE UM PESADELO - Dia 22







Hoje o dia foi de caminhada.
E ser de caminhada, significa poder dispor de momentos introspectivos e de muita reflexão.  Momentos de abstracção pura do mundo cá fora, e onde apenas eu e a Natureza nos partilhamos em profunda cumplicidade.
O dia predispôs-se a isso, com sol, céu azul e limpo, depois de ontem, como vos contei, ter chovido grande parte do tempo.

Continuei a matutar sobre o que publiquei na minha última "história", no dia que encerrava as primeiras três semanas de isolamento.
Falava então da circulação incontrolável da proliferação de vídeos, assuntos de opinião, notícias, e toda uma poluição razoavelmente excessiva e por vezes perigosa, para a nossa capacidade discernidora, a propósito da Covid 19.
E debruçava-me sobretudo sobre uma onda que de alguma forma me está a assustar, e que, pelos mais variados caminhos, induz as pessoas a aceitarem que a catástrofe que vivemos, advém de uma qualquer auto-regulação do planeta Terra, no sentido de se proteger "in extremis" de todos os atropelos destruidores, quase irreversíveis, que nas últimas décadas o Homem lhe tem infligido.
O ser humano tem-se desrespeitado e desrespeitado o Universo globalmente, como se aponta com profundo ênfase. Não protege e destrói sistematicamente a Natureza, não valoriza as relações com o seu semelhante, a começar pelas familiares, esquece valores éticos, sociais, humanitários e outros ( entre muitos outros aspectos, de que falei ontem ) ... e portanto, por um qualquer desígnio estranho, por um qualquer determinismo do destino, uma hecatombe sem tamanho abateu-se sobre todos nós, numa espécie de vingança ou révanche  de  forças  ocultas  que  não  descortino,  mas  que  "nos  dão que  pensar ... lá  isso  dão "!...

E aqui, inevitavelmente coloca-se a questão das religiões.
Cada uma, à sua medida e de acordo com os seus objectivos, impõe-nos uma qualquer explicação cataclítica sobre o que vivemos.
É como se tivesse chegado a hora do grande puxão de orelhas ao ser humano !
É como se uma entidade superior, um Deus, desiludido e cansado de tanto descalabro, tivesse mandado parar !  Parar, como solução única para uma humanidade totalmente doente e perdida.
Parar, para expurgar todo o erro que se arrasta em incúria e descaso ... parar para, os que ficarem, poderem reiniciar um "admirável mundo novo" ...

Eu sei que tudo isto que escrevo é polémico, é contundente, talvez possam achar eventualmente provocador.
Garanto-vos que não é de todo, esse o meu objectivo.
Uma quarentena, um isolamento, todo este processo traumático que vivemos, toda a ansiedade e angústia inerentes a situações-limite como esta, são propícios a muita reflexão, muita questionação interior, muito diálogo comigo mesma.
Sempre mantenho uma dialéctica profunda nos meus silêncios, e na ausência de interlocutores próximos, encontro na escrita a forma de exorcizar fantasmas, expor opiniões, extravasar sentimentos e emoções ... até de afugentar medos ou mesmo terrores ...
E por isso me exponho sem nenhum tipo de problema.  Porque também é para isso que resolvi escrever esta "História de um Pesadelo", que me e vos acompanha.

Sou agnóstica, apesar de uma formação religiosa católica até à adolescência.
Como tal, assalta-me com alguma frequência a seguinte questão : será o Homem uma Criatura, ou  contrariamente, será ele o criador do seu próprio Deus, como busca de uma necessidade de dar sentido a tudo o que ocorre à sua volta ?!
Porque, tenho para mim que o Homem não suportaria jamais, a angústia de se sentir entregue ao acaso ...
Dessa forma, simplificar-se-ia a explicação do bem e do mal que o rodeia ...
Ou seja,  facilmente se arranja um nexo de causalidade entre a falta e o castigo, entre o crime e a punição, entre o virtuosismo, o merecimento e a compensação.
Tudo numa espécie de "deve e haver"  ou "comércio celestial" !...

Mas nessa óptica, como explicar  o valor das "facturas" a serem pagas pelo ser humano ( ainda que não seja merecedor de compaixão, perdão ou simples contemplação ), sendo Deus misericórdia, generosidade, amor ... sendo Deus, PAI ?!...

Leio que no Reino Unido se pede ( ? ) aos utentes dos lares de idosos que assinem um termo de responsabilidade, para que, em necessidade de reanimação, a declinem ...
Nos Estados Unidos, um bebé de seis semanas sucumbe à pandemia ...
Na Bélgica é uma criança de doze anos que não resiste ...
Duas médicas alertam e imploram que transfiram, urgentemente,  os refugiados dos campos onde vivem em condições sub-humanas, porque se o vírus assassino neles penetrar, haverá uma verdadeira dizimação ...
É necessário circular  um abaixo-assinado emanado do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, na voz do seu Secretário- Geral António Guterres, para que pelo planeta, nas zonas de conflitos que parecem eternizar-se, possa haver um imediato cessar-fogo...
No Mundo, os números devastadores da pandemia são absurdos e sem contenção...
Na Itália, na Espanha e certamente em breve noutros países, com hospitais em situação de ruptura, existem já protocolos, para escolhas sobre quem tem mais viabilidade de viver ...
Nas ruas, os sem-abrigo, têm o céu como telhado da casa onde farão o seu "isolamento" profiláctico...
De África, pouco se fala.  Num continente que será um verdadeiro barril de pólvora, pouco se conhece das suas condições sanitárias para o corona vírus ...

Já expressei a minha definitiva convicção face a este terramoto existencial ...
Para mim, que sou uma pessoa com formação científica, ainda assim carregada de dúvidas, incertezas, angústias e fragilidades ... e respeitando quem pensa de forma diferente, no pragmatismo que tento cultivar, a pandemia da Covid 19, é um mero "acidente de percurso" na história da Humanidade, que tive o azar que caísse na minha geração.
É uma calamidade sem dimensão, biologicamente já muito bem explicada, com origem na China e suas formas de vida, com uma primeira transmissão acidental para os humanos, que com a livre circulação completamente louca pelo Mundo todo, acabaram fazendo o resto ...
Um vírus invisível, com poucos nano-metros de dimensão, uma agressividade feroz e uma velocidade de propagação praticamente imparável, constitui mais uma catástrofe sanitária, como muitas outras que ao longo das eras ocorreram, e dizimaram ciclicamente os habitantes da Terra !...

E não mais !!!...

Até amanhã !  Fiquem bem, se fazem favor !

Anamar

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