sábado, 4 de abril de 2020

" AQUI DA MINHA JANELA " - HISTÓRIA DE UM PESADELO - Dia 24




Acabei de almoçar quase agora ... horários ainda mais bagunçados para quem já de si, é bagunçada mesmo .  Sou indisciplinada e um pouco / bastante "fora da caixa", como se usa dizer agora.
Tirei o cafezinho de fim de refeição que me aconchega a alma, e fui tomá-lo calmamente junto da vidraça.
O meu largo está irreconhecível, mas ainda assim preocupa-me bastante o que vejo diariamente.
As ruas têm de facto pouca circulação de trânsito, as pessoas chegam-se às janelas ou às varandas, tentando respirar um pouco mais, ou simplesmente, para os que não o dispensam, fumar mais um cigarro.   À noite é um deserto absoluto.
Mas, existem aqui dois supermercados ( um Continente e um Minipreço ), uma loja de conveniência e um talho.  São impressionantes  as filas diárias em permanência, que o acesso a eles, suscita.
Eu pergunto-me ... mas esta gente faz compras todos os dias, a todas as horas, como tradicionalmente fazia ?!... A maioria das pessoas não usa máscara, nem luvas protectoras.  Falam placidamente ao telemóvel, displicentemente, como quem aguarda na fila do cinema ...
E interpreto esta postura descontraída da população, comparativamente a imagens veiculadas de Espanha ou de Itália, como uma negligência assustadora, como uma inconsciência absoluta ou, como também nos caracteriza muito,  aquela bonomia e placidez, de acharmos que não será tanto assim, e que haverá uma estrelinha não sei bem onde, com um guarda-chuva protector de todo o país ...

O vírus é insidioso, já foi afirmado milhões de vezes.  O vírus é silencioso de mais, e fortuito ataca como um ladrão ... usando a distracção e o despreparo de quem ataca.
Parece espreitar-nos em cada esquina, em cada pessoa com quem nos cruzamos, com quem trocamos um simples bom dia ...
A sua arma é o medo ... e esse, está estampado em alguns dos olhos por detrás das máscaras.

Está a ficar cinzento, o dia ...
Hoje foi cremado o amigo que falecera na última terça-feira.  Gostaria de ter podido prestar-lhe uma última homenagem.  Não foi possível !...
Hoje foi "adormecido" o husky branco de outro amigo.  De olhos azuis, como o céu e o mar dos caminhos que  percorria com o dono, companheiro de dezasseis anos da sua vida, deixa, nesta altura, por acréscimo, um vazio afectivo e uma dor inestimáveis ...
Entende isto, quem ama os animais ...
Hoje é sábado, um sábado pardo, rasando a Páscoa que chegará daqui a uma semana.  Uma Páscoa diferente, estranha, uma Páscoa que assume desde já as cores da Paixão ... de uma Paixão que se vive já há demasiado tempo pelo Mundo fora ...
Falarei disso um destes dias ...
Hoje é dia 4.  Daqui a uma semana fará dois anos que a minha mãe partiu.  Também falarei disso ...
Hoje estou deprimida.  Desanimada.  Saudosa.  Triste ... muito triste !...

A vida virada ao contrário.  A vida, suspensa.  A sensação amarga, mais presente do que nunca, da fragilidade do ser humano e da precariedade da existência ...
O povo diz : " O Homem põe e Deus dispõe " ... Mas eu, que não entendo esta autoridade aleatória, ainda que me possam argumentar poder advir da pedagogia de uma entidade que não identifico, sinto-me no olho de um furacão, num tsunami sem escapatória  ... num deserto sem oásis, bússola ou norte !...

Até amanhã !  Fiquem bem, por favor !

Anamar

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